dc.description.abstract | O Sr. Ministro Oscar Corrêa: (Relator) 1. A matéria versada neste recurso reveste-se da maior importância, não só jurídica - que as questões que nela se põem só agora chegam á Corte - como econômica, no mais amplo sentido. Cuida de 'gansferência de tecnologia, pressuposto moderno do desenvolvimento; sem ela, as nações menos desenvolvidas e, por isso mesmo, atrasadas, em face dos constantes e inatingíveis avanços tecnológicos das desenvolvidas pós-industrializadas, estarão em completo , permanente e crescente descompasso, que as distanciará, cada vez mais, e mais aceleradamente, das modemas conquistas da técnica. Não é necessário enfatizar as conseqüências disso, se estão presentes na luta cotidiana a que a Nação assiste, e sofre, para vencer esse distanciamento insuportável, ou pelo menos impedir - o que já não é fácil - aumente o hiato que a separa das modemas conquistas da ciência. 2. Dos percalços para assegurar essa transferência basta dizer que as comunidades que as conseguem antes das outras, exigem, para transmiti-las preços que variam desde somas vultosas, em dinheiro forte, até a própria abdicação de parcela de independência. E valem, nessa como em outras áreas do relacionamento internacional, todos os métodos e expedientes, Iícitos ou ilícitos, morais ou imorais, se o fim é a conquista ampla e, se possível, permanente, de mercados, assegurando o crescente domínio, que, muitas vezes, chega á absorção da independência, para não falar em soberania, palavra que a muitos desagrada. Entende-se, pois, o significado que alcançam essas disputas, tanto mais quanto, do lado das nações menos adiantadas - para não dizer mais atrasadas e subdesenvolvidas - essa transferência, com perspectiva e busca de conseqüente absorção de tecnologia, é vital; com o que nem sempre se ponderam, equilibradamente, os riscos a que se submetem, na ãnsia de alcançá-lo.V 3. Essas breves considerações - que a E. Turma nos escusará surgem no exame da espécie: de um lado, a empresa, que procura situar-se no campo de atividades que desenvolve, e anseia pela aquisição de novas técnicas, que lhe permitam posicionar-se em condições competitivas no mercado - difícil e extraordinariamente sensível mercado que se dedica, talvez o mais dinâmico e ativo; de outro, o órgão especialmente destinado ao exame e controle das condições em que deverá dar-se essa transferência, e a desejável absorção de tecnologia, devendo ter em vista as melhores condições de alcançá-lo e subordinado, como no próprio texto legal (artigo 2° da Lei n° 5.648/70), à sua função social, econômica, jurídica técnica que bem avaliar, em defesa do interesse nacional. É óbvio que podem verificar-se choques de interesses e conveniências, se mesmo admitindo-se que não são colidentes os objetivos finais de empresa e INPI - ambos colimando o interesse nacional nessa transferência de tecnologia - nem sempre hão de revestir-se, na forma de guardar idêntico ritmo e obedecer a iguais meios de formulação. (...) 5. Não nos parece tal, data venia: a questão não se cinge ao dispêndio de divisas, nem só isto diz respeito ao desenvolvimento econômico. A complexidade da questão transferência de "Know how" - expressão que identifica o conhecimento tecnológico, amplamente - abrange aspectos que se envolvem em dados inabarcáveis, e não ê o consumo de divisas o único, nem o mais importante deles, como se deflui das breves considerações anteriormente feitas. A eles supera a selego da tecnologia a absorver, pois, o mais grave, é optar - entre processos diversos - o que mais se adapta às realidades nacionais; e não apenas em condições materiais (recursos fisicos disponiveis) como imateriais - inclusive a capacidade e conveniência, dados de difícil avaliação a não ser pelo conhecimento amplo e profundo das condições econômicas e sociais. Por isso mesmo impõe-se admitir na ponderação de motivos, certa área de discricionariedade, que não é possivel eliminar, pois mais sevi deva exigir do órgão responsável que atue nos limites de vinculação que a lei lhe impõe. 6. Por isso mesmo, a Lei n° 5.648, de 11/12/1970, ao criar o INPI deu-lhe , no artigo 2° , por finalidade principal. executar, no âmbito nacional as normas que regulam a propriedade industrial, tendo em vista a sua função social, econômica, jurídica e técnica'. E, no parágrafo único, especificou: 'Sem prejuízo de outras atribuições que lhe forem cometidas o Instituto adotará, com vistas ao desenvolvimento econômico de acelerar e regular a transferência de tecnologia e de estabelecer melhores condições de negociação e utilização de patentes, cabendo-lhe ainda pronunciar-se quanto à conveniência da assinatura ratificação ou denúncia de convenções, tratados, convênios e acordos sobre Propriedade industrial". Da leitura atenta desse dispositivo verifica-se a amplitude da missão - e a gravidade e seriedade de que se reveste - que se conferiu ao Recorrido; e de como, dentro dos parâmetros legais, se inclui razoável parcela de discricionariedade, sem a qual não poderá desempenhá-la eficientemente. 7. Desde logo, o objetivo - o desenvolvimento econômico do País que não se mede apenas em conceito de avaliação material estrita, mas que desborda em aspectos imateriais, se só se completa com atingimento das finalidades humanas a que visa. E, dai em diante, as expressões que usa a lei: medidas, capazes de acelerar e regular a transferência de tecnologia com o que admite variado espectro de providências a serem tomadas; e, o que é mais, visando a acelerar e regular a transferência - o que impõe seleção, avaliação, opção; pois não é possível alcançá-lo senão pesando, medindo, harmonizando escolhas, matéria insuscetível de ater-se a ditames legais rígidos e explícitos. Mas, vai mais longe: estabelecer melhores condições de negociação eutilização de patentes; o que importa em aceitar e admitir que o INPI inten/enha - ao examinar os contratos submetidos a averbação ou registro - em análise das condições que se firmaram, devendovii definir-se quanto a elas. Bem como continua o parágrafo único do artigo 2° - pronunciar-se quanto à conveniência da assinatura, ratificação ou denúncia de convenções, etc. - com o que se amplia sua atuação a limites discricionários; se os 'critérios de conveniência são dificilmente comprováveis e explicitáveis e, menos ainda, estabelecíveis em te›‹to normativo. 8. lsto tudo deflui da importância vital da missão que a lei lhe deferiu o desenvolvimento econômico - no amplo e exato sentido, desenvolvimento humano, integrado, repetimos, porque não se pode atingi-lo sem que seu beneficiário direto e último - o homem - se desenvolva, no todo. Há de cercar-se, pois isso, a averbação de tais contratos, que impliquem em transferência de tecnologia - como prevista no artigo 126 do Código da Propriedade Industrial (Lei n° 5.772 de 21/12/71), de especial exame a avaliação; o que à empresa pleiteante parece excelente e real contribuição, em 'know how', ao Pais - sob a ótica especial, individual, em que se coloca, e sem prejuízo da honestidade de seus propósitos - pode, na verdade, não o representar, no exame complexo de uma realidade muito mais ampla, na vida geral do problema, de que presume a lei - o lNPl deve ter, como centro mesmo de todas as pretensões relativas ao mesmo objeto. 9. lncumbe-lhe verificar aspectos aos quais alheio, ou indiferente está o interesse particular como o controle das empresas nacionais, que pode ser posto em risco, sob várias formas, aparentes ou sub reptícias; a efetividade e conveniência da transferência de tecnologia pretendida; os limites em que se dará os processos utilizados; etc. Lembra, então, o Recorrente as fases que se podem distinguir nessa aquisição, invocando o ensinamento de Hen/ásio de Can/alho, então Presidente, do Conselho Nacional de Energia Nuclear, assim sintetizáveis: a) de utilização - o aprendizado do modus faciegndi - 'how to Q; b) de absorção - a reprodução mais fiel dos bens ou produtos o 'know how'.viii c) de adaptação - a face do 'know why' adequando a tecnologia ao país; d) da cria_c_a"o - o encontro de soluções originais - a fase da 'technical autonomy' É óbvio que, por sua importância, fundamental no processo de desenvolvimento, essa tentativa há de ser rigorosamente vista, fiscalizada, superintendida, supervisionada por órgão estatal. A esse respeito, a intervenção no domínio econômico não encontra opositores, se trata de área na qual o interesse privado há subordinar-se ao superior interesse geral, que o Estado encarna e representa. (...)" (STF, 1" T., RE 95382/RJ, Rel. Min. Oscar Correa, DJU de 26/08/1983) | pt_BR |