Brasil, 1964 : como uma reforma penal progressista emergiu durante uma ditadura militar conservadora
Resumo
Resumo: A tese apresenta como objeto de estudo a produção de normas penais progressistas durante a ditadura militar brasileira, particularmente no ano de 1984. A problematização central discute como durante um regime autoritário se pôde criar leis penais que, surpreendentemente, se mostraram mais progressistas que as implementadas na democracia que se seguiu. O problema é formulado em três pontos fundamentais: a relação entre novas leis penais e o contexto da ditadura, a maneira como a legalidade era tratada pelo regime e como ocorreram as reformas de 1984. As hipóteses da pesquisa exploram, de um lado, a possibilidade de um direito penal progressista ser produzido como forma de legitimação do próprio regime autoritário; de outro, questionam se a legalidade durante a ditadura poderia ser compreendida como um conjunto rizomático e multifacetado. A justificativa para o estudo se apoia na complexidade da relação entre legalidade e autoritarismo e na necessidade de discutir a herança jurídica do período ditatorial para o regime democrático. Os marcos teóricos principais incluem o conceito de "utopia autoritária" de Carlos Fico, que sugere um projeto de Estado forte e atuante para além da repressão, e a ideia do rizoma de Deleuze e Guatarri, que aponta para a complexidade da legalidade durante a ditadura. Esses marcos são complementados pela abordagem de Mario Sbriccoli sobre o duplo nível de legalidade e pelo conceito de ilegalismos de Michel Foucault, permitindo uma visão crítica sobre as leis e práticas repressivas do período. As hipóteses explicativas sugerem que a ditadura permitiu a criação de um direito penal relativamente independente devido à distinção entre legalidade formal e práticas de repressão realizadas em outros níveis normativos. Além disso, o saber jurídico dos juristas envolvidos garantiu a criação de um corpo legislativo alinhado tanto com o regime quanto com princípios penais reconhecidos. Em termos de referenciais teóricos, a tese mobiliza duas vertentes: a escola Fiorentina, que entende a cultura jurídica como dotada de uma autonomia própria, e a vertente de Curitiba, que aplica essa visão ao contexto brasileiro e a combina com outros marco-teórico metodológicos úteis à compreensão da cultura jurídica no cenário nacional. Os objetivos específicos da tese incluem: analisar a tendência brasileira de reforma legal, verificar a viabilidade de compreensão do regime militar com o binômio regra-exceção e investigar a tramitação e recepção das reformas dos anos 1980. A apresentação da tese é estruturada em três partes, discutindo a tradição reformista brasileira, a legalidade rizomática da ditadura e a análise das reformas penais de 1984. Nos resultados, a tese demonstra que as reformas de 1984 foram influenciadas por uma tradição jurídica brasileira de manias de reformas legislativas e que a repressão estatal foi transferida para fora do escopo penal, permitindo a aprovação das novas leis. Por fim, a discussão sugere um paradoxo: o direito penal progressista de 1984 foi produto de uma legalidade autoritária que destaca a necessidade de repensar as reformas penais contemporâneas Abstract: The thesis aims to understand the production of progressive criminal norms during the Brazilian military dictatorship, particularly the ones in the year 1984. The central problematisation discusses how during an authoritarian regime it was possible to issue criminal laws that, astonishingly, turned out to be more progressive than those implemented in the subsequent democratic period. The core issue is formulated into three key points: the relationship between new criminal laws and the dictatorship context, how legality was addressed by the regime, and the manner in which the 1984 reforms occurred. The hypotheses explore, on the one hand, the possibility of a progressive criminal law being produced as a form of legitimising the authoritarian regime itself; on the other hand, they question whether legality during the dictatorship could be understood as a multifaceted and rhizomatic set. The study is justified by the complexity of the relationship between legality and authoritarianism and the need to discuss the legal legacy of the dictatorial period in the democratic regime. The main theoretical frameworks include Carlos Fico’s concept of "authoritarian utopia," which suggests a strong and active state project beyond mere repression, and Deleuze and Guattari’s idea of the rhizome, which points to the complexity of legality during the dictatorship. These frameworks are complemented by Mario Sbriccoli’s approach to the dual level of legality and Michel Foucault’s concept of illegalisms, allowing for a critical perspective on the laws and repressive practices of the period. The explanatory hypotheses suggest that the dictatorship enabled the creation of a relatively independent criminal law due to the distinction between formal legality and repressive practices conducted on other normative levels. Moreover, the legal expertise of the jurists involved ensured the creation of a legislative body aligned with both the regime and recognised criminal legal principles. In terms of theoretical references, the thesis draws on two strands: the Florentine school, which views legal culture as possessing its own autonomy, and the Curitiba strand, which applies this perspective to the Brazilian context and combines it with other theoretical-methodological frameworks useful for understanding legal culture in the national scenario. The specific objectives of the thesis include: analysing Brazil’s tendency towards legal reform, viability of understanding the military regime through the rule-exception dichotomy, and investigating the approval and reception of the 1980s reforms. The thesis is structured in three parts, discussing Brazil’s reformist tradition, the rhizomatic legality of the dictatorship, and an analysis of the 1984 criminal reforms. The results demonstrate that the 1984 reforms were influenced by a Brazilian legal tradition characterized by a reform-fad and that state repression was shifted outside the scope of criminal law, allowing for the approval of new laws. Finally, the discussion suggests a paradox: the progressive criminal law of 1984 was a product of authoritarian legality, which highlights the need to rethink contemporary criminal reforms Riassunto: L’oggetto di questo lavoro è la produzione di norme penali progressiste durante la dittatura militare in Brasile, in particolare nel 1984. La questione principale riguarda come durante un regime autoritario sia stato possibile emanare delle leggi penali che, sorprendentemente, si sono rivelate più progressiste di quelle adottate dal successivo governo democratico. La questione centrale è articolata in tre punti principali: la relazione tra nuove leggi penali e il contesto della dittatura, il modo in cui il regime trattava la legalità e, infine, le modalità con cui avvennero le riforme del 1984. La ricerca valuta due ipotesi: l’una che un diritto penale progressista sia stato utilizzato come forma di legittimazione dal regime autoritario stesso; l’altra che, durante la dittatura, la legalità possa essere descritta come un insieme rizomatico e multisfaccettato. Lo studio trae legittimazione dalla complessità della relazione tra legalità e autoritarismo e dalla necessità di mettere in discussione l'eredità giuridica del periodo dittatoriale nel regime democratico. Tra i principali riferimenti teorici di questo lavoro si possono segnalare il concetto di "utopia autoritaria" di Carlos Fico, che suggerisce un progetto di Stato forte e attivo oltre alla mera repressione, e l’idea di rizoma di Deleuze e Guattari, che evidenzia la complessità della legalità durante la dittatura. A questi si aggiungono l’approccio di Mario Sbriccoli relativo al doppio livello di legalità e gli illegalismi descritti da Michel Foucault: questi ultimi offrono uno sguardo critico sulle leggi e sulle pratiche repressive del periodo. Le due ipotesi esplicative suggeriscono, innanzitutto, che la dittatura avrebbe permesso la creazione di un diritto penale relativamente indipendente grazie alla separazione tra una legalità formale e le pratiche repressive condotte su altri piani normativi. Inoltre, il sapere dei giuristi coinvolti ha garantito la creazione di un corpo legislativo in linea sia con il regime che con i principi penali riconosciuti. In termini di riferimenti teorici, la tesi mobilita due filoni: la scuola fiorentina, che intende la cultura giuridica come dotata di una propria autonomia, e il filone di Curitiba, che applica questa visione al contesto brasiliano e la combina con altri quadri teorico-metodologici utili alla comprensione della cultura giuridica nel contesto nazionale. Gli obiettivi specifici della tesi includono: analizzare la propensione tipicamente brasiliana al riformismo; verificare la possibilità di comprendere il regime militare attraverso il binomio regola-eccezione; indagare l’introduzione e il recepimento delle riforme degli anni '80. Il lavoro è strutturato in tre parti, discutendo la tradizione riformista brasiliana, la legalità rizomatica nella dittatura e l'analisi delle riforme penali del 1984. I risultati mostrano che le riforme del 1984 sono state influenzate da una tradizione giuridica brasiliana caratterizzata da una mania per le riforme e che la repressione statale è stata trasferita al di fuori dell'ambito penale, permettendo l'approvazione delle nuove leggi. Infine, si suggerisce un paradosso: il diritto penale progressista del 1984 è stato un prodotto di una legalità autoritaria, evidenziando la necessità di ripensare le riforme penali contemporanee
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