A norma fundamental kelseniana : um estudo sobre sua condição de norma fundante na estrutura escalonada do direito

Abstract

Resumo: A presente tese investiga a doutrina da norma fundamental kelseniana, com o objetivo de analisar sua condição de norma fundante da estrutura escalonada do direito. A pesquisa parte da percepção de que Hans KELSEN foi um dos mais importantes teóricos do direito, de que sua Teoria Pura do Direito é uma das mais influentes doutrinas, se não a mais, e de que, particularmente, o tema da norma fundamental constitui sua característica mais marcante, mas também a mais controversa. Como delimitação, questiona-se a necessidade, a possibilidade e a adequação teórica de uma norma fundamental como ponto de partida de um ordenamento jurídico. A metodologia adotada é qualitativa, de natureza teórica e analítica, com o objetivo de reconstruir a norma fundamental dentro dos marcos teóricos da Teoria Pura do Direito, com a modalidade de pesquisa sendo a bibliográfica, com revisão de fontes primárias e secundárias. Quanto à estrutura, este trabalho, primeiramente, apresenta a Teoria Pura do Direito e, ato contínuo, por meio dos textos originais e em ordem cronológica, resgata as concepções que teve KELSEN da norma fundamental, enfatizando as oscilações sofridas ao longo do tempo. Em seguida, dispõe as críticas que lhe foram feitas, organizadas a partir de uma classificação das objeções em transcendentes e imanentes. Dentre as críticas transcendentes, destaca-se a de que um positivismo sem incorporar valores legitimaria regimes autoritários. Dentre as imanentes, que seria uma forma disfarçada de naturalismo ou de sociologia, ademais de não estar em acordo com os próprios marcos da Teoria Pura do Direito. Na sequência, em análise à norma fundamental, escrutina-se suas funções, bem como sua necessidade e possibilidade. Quanto às funções, evidencia-se sua multiplicidade; no tocante à necessidade, esclarece-se em que sentido uma norma fundamental seria necessária em uma ordem jurídica escalonada; por fim, no que diz respeito à possibilidade, examina-se quais são as dificuldades que busca KELSEN superar ao conceber a norma fundamental como pressuposição. Em conclusão, reconstrói-se a norma fundamental como norma jurídica positiva, já que posta; implícita, pois não formulada expressamente; de competência, na medida em que constitui o detentor do poder originário em autoridade; autorreferencial, uma vez que interpreta sua própria positivação; e retroativa, porque o ato ponente da primeira norma jurídica é pretérito a sua intepretação como ato de autoridade. Essa reformulação permite resgatar a coerência interna da Teoria Pura do Direito sem comprometer sua pureza metodológica. Em síntese, a tese oferece uma releitura da norma fundamental, reafirmando sua centralidade teórica na construção kelseniana, ao mesmo tempo em que responde às objeções com uma proposta de reformulação que preserva os princípios do positivismo

Abstract: This dissertation investigates the doctrine of the Kelsenian basic norm, with the aim of analyzing its status as a founding norm within the hierarchical structure of law. The research begins from the premise that Hans KELSEN was one of the most important legal theorists, that his Pure Theory of Law is among the most influential doctrines—if not the most influential—and that the concept of the basic norm, in particular, constitutes its most distinctive and, at the same time, most controversial feature. As a delimitation, the study questions the necessity, the possibility, and the theoretical adequacy of a basic norm as the starting point of a legal order. The adopted methodology is qualitative in nature, theoretical and analytical in approach, aiming to reconstruct the basic norm within the conceptual framework of the Pure Theory of Law. The research is bibliographical, based on a review of both primary and secondary sources. Structurally, the dissertation first presents the Pure Theory of Law and then, through a chronological examination of KELSEN’s original writings, reconstructs his various conceptions of the basic norm, emphasizing the shifts and developments they underwent over time. It then presents the main criticisms addressed to the doctrine, organizing them into two categories: transcendental and immanent objections. Among the transcendental criticisms, the most prominent is that a form of positivism devoid of value considerations would legitimize authoritarian regimes. Among the immanent ones, critics argue that the basic norm is a disguised form of natural law or sociology, and that it is inconsistent with the internal presuppositions of the Pure Theory of Law itself. The analysis then turns to the functions, necessity, and possibility of the basic norm. Regarding its functions, the dissertation highlights their multiplicity; concerning its necessity, it clarifies in what sense a basic norm would be required in a hierarchical legal order; and concerning its possibility, it examines the theoretical challenges KELSEN sought to overcome by conceiving the basic norm as a presupposition. In conclusion, the dissertation reconstructs the basic norm as a positive legal norm: posited, though implicit (since not explicitly formulated); a norm of competence, insofar as it constitutes the authority of the original lawgiver; self referential, insofar as it interprets its own positivization; and retroactive, in that the enactment of the first legal norm precedes its interpretation as an authoritative act. This reformulation enables the recovery of the internal coherence of the Pure Theory of Law without compromising its methodological purity. In sum, the dissertation offers a reinterpretation of the basic norm that reaffirms its theoretical centrality in Kelsen’s construction while responding to the objections through a reformulation that preserves the core principles of legal positivism