Ressignificando o estado civil : de divorciado(a) a (re)solteiro(a)

Abstract

Resumo: A presente tese tem por objetivo a ressignificação do estado civil de divorciado, a partir do remodelar ontológico do instituto, permitindo a retomada – em circunstâncias próprias e específicas – do status familiae de solteiro(a). Metodologicamente, em movimentos interpretativistas, realiza-se uma análise histórico-evolutiva do divórcio, voltada a compreender os contornos atuais deste relevante conceito jusfamilista e, também, propor uma dinamização do estado civil que admita a reconstituição do estado civil anterior ao casamento. Com o reconhecimento jurídico da dissolubilidade do casamento, o divórcio ganhou elevada relevância na conformação de um direito de família que se proponha ao fomento da dignidade humana. E isso porque, objetivamente, a secularização do matrimônio deslocou o eixo da proteção do vínculo marital, concedendo o espaço de protagonismo à pessoa humana. No entanto, apesar de superar a natureza sacrossanta do casamento, impõe-se uma nova realidade potencialmente subjugadora: a ditadura do registro civil do divórcio. Afinal, em não havendo celebração de novas núpcias, é impositiva a manutenção perene do status de divorciado(a) – algo que, ao menos em abstrato, poderia significar um estigma pessoal injustificável. A proposta central desta tese, então, repousa na possibilidade de modificação do estado civil por mera manifestação de vontade, desde que atendidas as exigências particulares para tanto. Não se trata de um apagar do histórico de vida dos indivíduos, com a prejudicialidade das funções relevantes do registro civil; pelo contrário, reconhece-se a imperiosidade da manutenção do histórico registral para diversos fins, o que, porém, não inviabiliza a proposição de transitoriedade do status de divorciado(a), cuja modificação – opcional, e não impositiva – deve estar afinada à dimensão funcional da autonomia da vontade. A ostentação obrigatória do estado civil de divorciado(a) se justificaria apenas nos casos em que houvesse alguma pendência matrimonial por solucionar (v.g., ausência de partilha patrimonial ou debate sobre questões afetas à prole). Nos demais, permitir-se-ia que ex-cônjuges, em o desejando, modificassem volitivamente o seu status, para retomar junto ao registro civil, o estado civil de solteiro(a). Dessa maneira, remodela-se a concepção do estado civil, superando os grilhões da aparente intangibilidade da disciplina de ordem pública para deslocar o seu eixo ao norte da autodeterminação individual. Para que a tese se formate da maneira esperada, apresenta-se, complementarmente, uma reformulação da concepção de estado civil, que deixa a sua condição instrumental para inspirar uma proteção finalística por parte do ordenamento jurídico. Assim, tem-se uma guinada da concepção ontológica do status civitatis, que reclama uma mudança paradigmática essencial voltada ao fomento da dignidade da pessoa humana – notadamente à figura das mulheres. O ordenamento jurídico pátrio, sob o manto da metodologia civilconstitucional, não apenas comporta o rearranjo conceitual do estado civil como, mais que isso, impõe a necessidade de reformulação do instituto. Somente por essa via é que se pode equacionar o conceito do divórcio à proposta de emancipação da pessoa humana. A presente tese é um estudo de registro civil que, em última análise, busca a promoção da dignidade humana, inaugurando a era de um novo individualismo jusfamilista, com ênfase na dinamização do estado civil.

Abstract: The present thesis has the objective of building a resignification of the divorced marital status, from the ontological remodeling of the institute, allowing the resumption - in specific circumstances - of the single-family status. Methodologically, in interpretivists movements, a historical-evolutionary analysis of divorce is carried out, aimed at, at the same time, understanding the current contours of this relevant jusfamilist concept and proposing a dynamization of the marital status that admits the reconstitution of the marital status prior to the wedding. With the legal recognition of the dissolution of marriage, divorce has gained high relevance in the conformation of a family law that proposes to promote human dignity. And this is because, objectively, the secularization of marriage ended up displacing the axis of protection of the marital bond, giving the human person the space of protagonism. However, despite overcoming the sacrosanct nature of marriage, a potentially overwhelming new reality imposes itself: the dictatorship of divorce. After all, in the absence of a new marriage, the individual is forced to permanently maintain his or her divorced status – something that, at least in the abstract, could mean an unjustifiable personal stigma. The central proposal of this thesis, then, rests on the possibility of modifying the marital status by mere manifestation of will, provided that the particular requirements are met. It is not a question of erasing the life history of individuals, with the prejudice of the relevant functions of the civil registry; on the contrary, it is recognized that it is imperative to maintain the registration history for various purposes, which, however, does not preclude the proposition of transience of the divorced status, whose modification – optional, and not imposed – must be in tune with the dimension functional autonomy of the will. The mandatory display of the divorcee's marital status would only be justified in cases where there was some unresolved matrimonial dispute (e.g., absence of property sharing or debate on issues affecting the offspring). In the others, the exspouses, if they so wish, would be allowed to change their status volitionally, in order to resume their single marital status with the civil registry. In this way, the conception of marital status is remodeled, overcoming the shackles of the apparent intangibility of the discipline of public order to shift its axis to the north of individual self-determination. In order for the thesis to be formatted as expected, a reformulation of the very conception of marital status is presented, which leaves its instrumental condition to inspire a finalistic protection by the legal system. Thus, there is a shift in the ontological conception of status civitatis, which calls for an essential paradigm shift aimed at fostering the dignity of the human person – notably the figure of women. The national legal system, under the cloak of a civil-constitutional methodology, not only includes the conceptual rearrangement of marital status but, more than that, imposes the need to reformulate the institute. Only in this way can the concept of divorce be equated with the proposal for the emancipation of the human person. The present thesis is a study of civil registration that, in the final analysis, seeks to promote human dignity, inaugurating the era of a new jusfamilist individualism, with an emphasis on the dynamization of the marital status.