As mulheres rés em processos criminais na Vila de Curitiba oitocentista (1803-1816)

Abstract

Resumo: A presente pesquisa investiga as formas de criminalização feminina na Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais de Curitiba entre os anos de 1803 e 1816, a partir da análise de quatorze processos criminais custodiados pelo Arquivo Público do Paraná. A pesquisa parte da perspectiva da história do direito das mulheres, com atenção especial às implicações de gênero no sistema de justiça do Antigo Regime. Adotando a metodologia indiciária proposta por Carlo Ginzburg, o estudo reconstrói trajetórias femininas marcadas por conflitos relacionados à honra e à violência, evidenciando como o sistema jurídico colonial operava não apenas com base na norma escrita, mas também por meio de práticas negociais, estratégias locais e relações de poder. A pesquisa articula aspectos da cultura jurídica com a estrutura urbana, composição demográfica e circularidade social da vila, revelando que — apesar da seletividade e das limitações da justiça colonial — mulheres pobres, livres ou libertas conseguiam acessar o sistema judiciário e deixar rastros documentais de suas resistências e vivências. A análise também destaca a incidência da economia da graça como elemento central nas resoluções judiciais. O trabalho contribui para o campo da história do direito ao lançar luz sobre um contexto periférico e pouco explorado

Abstract: This research investigates the forms of female criminalization in the village of Nossa Senhora da Luz dos Pinhais de Curitiba between 1803 and 1816, based on the analysis of fourteen criminal cases preserved by the Public Archive of Paraná. The study adopts the perspective of the history of women's rights, with special attention to the gender implications within the justice system of the Ancien Régime. Employing the evidential paradigm proposed by Carlo Ginzburg, the work reconstructs female trajectories marked by conflicts related to honor and violence, revealing how the colonial legal system operated not only on the basis of written law but also through negotiation practices, local strategies, and power relations. The research connects aspects of legal culture with the urban structure, demographic composition, and social mobility of the village, showing that—despite the selectivity and limitations of colonial justice—poor, free, or freed women were able to access the judicial system and leave documentary traces of their resistance and lived experiences. The analysis also highlights the central role of the economy of grace in judicial outcomes. This study contributes to the field of legal history by shedding light on a peripheral and underexplored context, proposing gender as a central category of analysis