Intelectuais e jogos de linguagem nos debates sobre o ensino superior na Associação Brasileira de Educação (1924-1950)
Resumo
Resumo: O objetivo desta tese é analisar os discursos enunciados pelos intelectuais vinculados à Associação Brasileira de Educação (ABE), relacionados ao tema da educação superior, entre os anos de 1924 e 1950. Entre os principais púlpitos de veiculação desses discursos destacamos as Conferências Nacionais de Educação, realizadas em diferentes estados brasileiros e que representaram espaços de discussão de problemas educacionais, considerados por esse grupo de intelectuais como estratégicos para o país. Nesse quadro, a organização do ensino superior fez parte de disputas que envolveram, tanto os intelectuais vinculados à ABE como o Estado, na perspectiva de projetar políticas e projetos que visavam a formação do povo e das elites brasileiras. Considerando os momentos e os lugares de enunciação dos discursos, coube indagar quais estratégias foram mobilizadas pelo grupo, para convencer os seus interlocutores da centralidade de políticas que efetivassem o desenvolvimento da educação superior universitária no Brasil. O recorte temporal da pesquisa compreende o período delimitado entre a criação da ABE (1924), constituída como entidade da sociedade civil, e a realização da X Conferência Nacional de Educação (1950), evento que visou a formulação de sugestões à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que tramitava no Congresso. As principais fontes mobilizadas foram: as teses apresentadas nas CNEs realizadas ao longo de 23 anos (1927-1950); os boletins, inquéritos, atas e pareceres produzidos pela Associação; o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932); notícias da imprensa jornalística do período; leis e decretos. Como orientação teórico-metodológica utilizamos o conceito de intelectual, elaborado por Carlos Eduardo Vieira. Como instrumental à análise do discurso educacional, apoiamo-nos no contextualismo linguístico, entendido como teoria de interpretação histórica, que tem como foco a análise do funcionamento da linguagem, proposto pelos historiadores Q. Skinner e J. Pocock. Tomando por base a premissa de que a ABE buscava promover no Brasil a difusão e o aperfeiçoamento da educação em todos os seus níveis e ramos, nos empenhamos no sentido de demonstrar dois aspectos. O primeiro remete ao horizonte de expectativas assumido pelos intelectuais engajados nos debates acerca da educação superior, que projetavam a consolidação do ensino e da pesquisa no regime universitário. Estes intelectuais professavam a crença de que, desse modo, a educação universitária – em contraste com a tradição oriunda do século XIX do ensino estritamente profissionalizante, oferecido por faculdades isoladas – representaria uma elevação da alta cultura. Esta, por sua vez, seria capaz de dar força, eficácia e coerência a ações e intervenções na sociedade brasileira ao formar elites, que seriam determinantes para a governança do país. O conceito de elite dirigente, predominante nessa formulação, foi informado por uma noção meritocrática, que elidia as condições de profunda desigualdade social presente na sociedade brasileira. Considerada a fórmula adequada à formação daqueles que desenvolveriam projetos públicos ou privados coerentes com a economia liberal, a educação universitária e científica se constituiria como o preceito eficaz para orientar ações capazes de concretizar o dever ser moderno do Brasil. O segundo aspecto, em estreita sintonia com o primeiro, envolve a elaboração, por parte dessa intelligentsia, de maneiras peculiares de falar sobre a educação, formulando jogos de linguagem, que articulavam os conhecimentos para servirem de garantia às suas críticas e proposições. Estes jogos se 8 caracterizaram por mobilizar conceitos oriundos dos discursos científico, econômico e político visando fazer das palavras atos de fala, capazes de interferir na forma como se conduziam as políticas educacionais no Brasil. Em outros termos, a um só tempo, considerando o caráter performativo da linguagem, no interior desses jogos de linguagem os intelectuais enunciavam problemas, demarcavam as ações necessárias e buscavam a sua execução, especialmente na formulação da legislação educacional, a partir da aproximação e da conciliação da entidade com as forças políticas hegemônicas no aparelho estatal Abstract: The objective of this thesis is to analyze the discourses enunciated by intellectuals linked to the Brazilian Education Association (ABE) on the subject of higher education between 1924 and 1950. Among the main platforms from which these discourses were disseminated, we highlight the National Education Conferences, held in different Brazilian states and which represented spaces for discussing educational problems, considered by this group of intellectuals as strategic for the country. In this context, the organization of higher education was part of disputes that involved both the intellectuals linked to the ABE and the State, with a view to designing policies and projects aimed at educating the people and the Brazilian elites. Considering the times and places where the discourses were enunciated, it was necessary to investigate which strategies were mobilized by the group to convince its interlocutors of the centrality of policies that would effectively develop higher education in Brazil. The time frame of the research covers the period between the creation of ABE (1924), established as a civil society entity, and the holding of the 10th National Conference on Education (1950), an event that aimed to formulate suggestions for the Law of Guidelines and Bases of National Education, which was being processed in Congress. The main sources used were: the theses presented at the CNEs held over 23 years (1927-1950); the bulletins, surveys, minutes and opinions produced by the association; the Manifesto of the Pioneers of New Education (1932); news from the press of the period; laws and decrees. As a theoretical and methodological guideline, we used the concept of intellectual, developed by Carlos Eduardo Vieira. As a tool for the analysis of educational discourse, we relied on linguistic contextualism, understood as a theory of historical interpretation, which focuses on the analysis of the functioning of language, developed by historians Q. Skinner and J. Pocock. Based on the premise that ABE sought to promote the dissemination and improvement of education in Brazil at all levels and branches, we endeavored to demonstrate two aspects. The first refers to the horizon of expectations assumed by intellectuals engaged in debates about higher education, which projected the consolidation of teaching and research in the university system. These intellectuals professed the belief that, in this way, university education – in contrast to the tradition originating from the 19th century of strictly professionalizing education offered by isolated colleges – would represent an elevation of high culture. This, in turn, would be capable of giving strength, effectiveness and coherence to actions and interventions in Brazilian society by forming elites, who would be decisive for the country's governance. The concept of ruling elite, predominant in this formulation, was informed by a meritocratic notion, which elides the conditions of profound social inequality present in Brazilian society. Considered the appropriate formula for training those who would develop public or private projects consistent with the liberal economy, this university and scientific education would constitute an effective precept for directing actions capable of realizing Brazil's modern duty to be. The second aspect, closely aligned with the first, involves the development, by this intelligentsia, of peculiar ways of talking about education, formulating language games that articulated knowledge to serve as a guarantee for their criticisms and propositions. This game was characterized by mobilizing concepts originating from scientific, economic and political discourses with the aim of turning words into speech acts, capable of influencing the way in which educational policies were conducted in Brazil. In other words, at the same time, considering the performative nature of language, within these language games the intellectuals enunciated problems, demarcated the necessary actions and sought their implementation, especially in the formulation of 10 educational legislation, based on the entity's approximation and conciliation with the hegemonic political forces in the state apparatus
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