Um estudo documental sobre as queixas de mulheres vítimas de violência, registradas no CRAM : dimensões psicossociais e educativas

Abstract

Resumo: A violência nesta pesquisa foi abordada como uma síntese das relações e condições sócio-históricas vividas pelas pessoas envolvidas nessa dinâmica da violência, apoiando-se em aportes oriundos do campo da psicologia social comunitária, e tendo como perspectiva pensar ações pedagógicas e educativas dirigidas à formação e preparação profissional para esse enfrentamento. Na tese buscou-se uma compreensão sobre as dimensões psicossociais que emergem das queixas de mulheres vítimas de violência relatadas ao Centro de Referência de Atendimento à Mulher em Situação de Violência (CRAM). O objetivo da pesquisa foi analisar os relatos de mulheres vítimas de violência doméstica, documentados nos atendimentos junto ao CRAM do Município de Guarapuava, no estado do Paraná. O termo queixa empregado neste estudo é no sentido psicossocial como relato e expressão de dor e sofrimento, ou ainda, como lamúria ato de falar de modo triste sobre a violência sofrida. Realizou-se um levantamento de teses e dissertações, defendidas no período de 2006 a 2021 no catálogo da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Analisaram-se 52 trabalhos de teses e dissertações, sendo que os fatores identificados como responsáveis para que a violência ocorra estão relacionados às categorias ligadas ao compartilhamento de valores, além da expressão concreta das desigualdades de gênero na dominação e poder masculino. Dentro da coleta de dados documentais e presentes nesta pesquisa documental a respeito das queixas registradas nas planilhas do CRAM foram selecionadas 72 queixas. Na análise qualitativa realizada nestas 72 queixas, utilizou-se análise de dados descritiva, primeiramente, sistematização dos dados guiados pelas modalidades de atendimentos estabelecidos no CRAM e, após a descrição dos eixos categorias criadas a posteriori a respeito dos significados das queixas, perspectivas de futuro na relação com companheiro\marido, e na estrutura familiar. As queixas registradas no CRAM compreendem o período de 2016 a 2022, e a análise central recaiu nos relatos registrados no ano de 2021. Foram 72 queixas estudadas em profundidade. Como resultado, as queixas das mulheres possuem relatos de vivências desumanas, violências que descortinam suicídio, depressão, falta de memória, síndrome do pânico e outras doenças psicossomáticas e que impactam na saúde mental da mulher e das pessoas próximas. As queixas parecem dizer que é preciso pensar em formas de apoio às mulheres vítimas dessa violência, envolvendo aspectos relacionados aos significados para as suas relações, em termos de continuidade ou não. Esse apoio não possui relação com uma punição criminal ou aplicação da Lei Maria da Penha. O pedido de apoio ou atendimento psicológico parece estar presente nas queixas como uma ajuda para suportar a violência sofrida, e não necessariamente romper com a violência ou com a família. A continuidade da denúncia mostrou-se como insuficiente para ruptura da violência. As perspectivas de uma vida sem violência não são sinalizadas, apenas a manutenção da família apareceu como valor sedimentado e desejado pela mulher. As intervenções precisam ser em comunidade, no espaço público, privado e coletivo, constituídas dentro de um processo participativo, com o intercâmbio de conhecimentos, práticas e experiências entre profissionais que trabalham ou pesquisam a violência e a população.

Abstract: Violence in this research was approached as a synthesis of the relationships and sociohistorical conditions experienced by the people involved in this dynamic of violence, based on contributions from the field of community social psychology, and having as a perspective to think about pedagogical and educational actions aimed at training and professional preparation for this confrontation. The thesis sought to understand the psychosocial dimensions that emerge from the complaints of women victims of violence reported to the Reference Center for Assistance to Women in Situations of Violence (CRAM). The objective of the research was to analyze the reports of women victims of domestic violence, documented in the consultations with the CRAM of the Municipality of Guarapuava, in the state of Paraná. The term complaint used in this study is in the psychosocial sense as a report and expression of pain and suffering, or even as a whining act of speaking sadly about the violence suffered. A survey of theses and dissertations was carried out, defended in the period from 2006 to 2021 in the catalog of the Coordination for the Improvement of Higher Education Personnel (CAPES). Fiftytwo theses and dissertations were analyzed, and the factors identified as responsible for the occurrence of violence are related to categories linked to shared values, in addition to the concrete expression of gender inequalities in male domination and power. Within the collection of documentary data and present in this documentary research regarding the complaints registered in the CRAM worksheets, 72 complaints were selected. In the qualitative analysis carried out on these 72 complaints, descriptive data analysis was used, firstly, systematization of the data guided by the modalities of care established in the CRAM and, after the description of the axes, categories created a posteriori regarding the meanings of the complaints, future perspectives in the relationship with a partner\husband, and in the family structure. The complaints registered in CRAM cover the period from 2016 to 2022, and the central analysis focused on reports registered in 2021. There were 72 complaints studied in depth. As a result, women's complaints include reports of inhumane experiences, violence that leads to suicide, depression, lack of memory, panic syndrome and other psychosomatic illnesses that impact the mental health of women and those close to them. The complaints seem to say that it is necessary to think about ways of supporting women who are victims of this violence, involving aspects related to the meanings for their relationships, in terms of continuity or not. This support is not related to criminal punishment or application of the Maria da Penha Law. The request for support or psychological care seems to be present in the complaints as an aid to bear the violence suffered, and not necessarily to break away from the violence or the family. The continuation of the complaint proved to be insufficient to stop the violence. The prospects for a life without violence are not highlighted, only maintaining the family appeared as a value established and desired by women. Interventions need to be in the community, in the public, private and collective space, constituted within a participatory process, with the exchange of knowledge, practices and experiences between professionals who work or research violence and the population.