Professoras negras : gênero, raça, religiões de matriz africana e neopentecostais na educação pública

Abstract

Resumo: Tratar, em uma pesquisa acadêmica, de religiões não é fácil e abordar o tema da religião e da política e mais difícil ainda, até porque na Constituição Federal esse tema já estaria resolvido com a laicidade. Mas o fato é que o debate continua em aberto na sociedade brasileira e, por isso, esta pesquisa se propôs a abrir um canal de comunicação entre a educação a partir de professoras negras, enfatizando a construção de suas identidades religiosas, buscando compreender as possíveis implicações da pertença religiosa na construção de identidade racial e de gênero e, consequentemente, das suas práticas pedagógicas de valorização das mulheres negras na educação. Algumas especificidades para a realização da pesquisa foram levadas em conta: o meu perfil de pesquisadora (mulher, negra, ativista e lyálòriçà). Por isso, considero-me como uma "observadora participante", uma vez que eu, como pesquisadora, assumo diferentes papéis no contexto da pesquisa. Ao mapear as professoras negras que atuam em redes públicas de educação básica, busquei identificar profissionais que sejam adeptas de religiões de matriz africana e religiões neopentecostais com, preferencialmente, mais de 10 anos de profissão. A pesquisa teve como caminho metodológico a construção de narrativas autorais de 6 (seis) professoras negras, sendo 3 (três) das religiões de matriz africana e 3 (três) de igrejas neopentecostais, atuantes em redes públicas de educação básica. Além disso, foram realizadas entrevistas semiestruturadas, tendo como objetivo compreender as formas como elas venciam suas práticas profissionais e a maneira como a religião interfere no seu cotidiano escolar. A pesquisa, ao enfrentar este debate, buscou contribuir para melhor compreensão acerca dos possíveis desafios da implementação da Lei 10.639/2003, tendo como foco de estudo as práticas pedagógicas de valorização das mulheres negras na educação, pensadas pelas professoras quando estas são religiosas e negras. Também pretendeu discutir sobre questões que prejudicam a sociedade, mas que nem sempre têm sido observadas com o devido cuidado e atenção: a relação entre igrejas neopentecostais e as religiões de matriz africana no Brasil. Considerando suas trajetórias de vida como professoras de educação básica, busquei compreender as possíveis implicações entre identidade religiosa com suas identidades de gênero e racial na construção de suas práticas pedagógicas de valorização da mulher negra e a qualidade destas. Os discursos dos dois grupos de professoras demonstrou como todas essas mulheres, de modo mais consistentes ou não, destacaram seus desafios e suas lutas diante de uma educação racista, seja em função de seu pertencimento étnico-racial (prevalecendo nas professoras evangélicas), seja pelo seu pertencimento étnico-racial e religioso, prevalecendo nas professoras candomblecistas, que enfatizaram que a educação deveria ser laica, mas se impõe sobre preconceitos e discriminações contra religiões de matriz africanas.

Abstract: In academic research, it is not easy to approach the issue of religion and politics, because in the Federal Constitution this issue would already be resolved with secularism. But the fact is that the debate remains open in Brazilian society and, therefore, this research proposed to open a channel of communication between education from black women teachers, emphasizing the construction of their religious identities, seeking to understand the possible implications of religious belonging in the construction of racial and gender identity and, consequently, of its pedagogical practices of valuing black women in education. Some specificities for carrying out the research were considered: my profile as a researcher (woman, black, activist and iyalori§a). Therefore, I consider myself a "participant observer", since I, as a researcher, assume different roles in the research context. When mapping the black women teachers who work in public basic education networks, I sought to identify women teachers who are adherents of African-based religions and neo-Pentecostal religions with, preferably, more than 10 years of profession. The research had as a methodological path the construction of authorial narratives of 6 (six) black women teachers, being 3 (three) from African origin religions and 3 (three) from neo-Pentecostal churches, active in public basic education networks. In addition, semi-structured interviews were carried out, with the objective of understanding the ways in which they overcome their professional practices and the way in which religion interferes in their school routine. The research, when facing this debate, sought to contribute to a better understanding of the possible challenges of the implementation of Law 10.639/2003, focusing on the pedagogical practices of valuing black women in education, thought by the teachers when they are religious and black. It also intended to discuss issues that harm society, but which have not always been observed with due care and attention: the relationship between neo-Pentecostal churches and religions of African origin in Brazil. Considering their life trajectories as teachers of basic education, I sought to understand the possible implications between religious identity and their gender and racial identities in the construction and quality of their pedagogical practices of valuing black women. The speeches of the two groups of teachers demonstrated how all these women, more consistently or not, highlighted their challenges and their struggles in the face of a racist education, whether due to their ethnic-racial belonging (prevailing in evangelical teachers), or because of the their ethnic-racial and religious belonging, prevailing in Candomblecist teachers, who emphasized that education should be secular, but imposes itself on prejudice and discrimination against religions of African origin.