Emoções, práticas docentes e inclusão escolar na perspectiva histórico-cultural : interlocuções entre Lev. S. Vigotsky, Yves Clot e Michel de Certeau

Abstract

Resumo: Esta pesquisa congregou contribuições de Lev S. Vigotski, Yves Clot e Michel de Certeau, com o objetivo geral de compreender o processo de desenvolvimento das emoções e sua transformação nas práticas docentes inclusivas. Defende-se a tese que a tomada de consciência das emoções em relação à inclusão escolar promove uma transformação que pode gerar mudanças no processo de desenvolvimento; desse modo, reconhecer e ressignificar as emoções que permeiam e compõem as práticas promove a transformação da atividade de trabalho, legitimando o poder de agir do professor no cotidiano da escola. Trata-se de uma pesquisa qualitativa de caráter exploratório e interpretativista, fundamentada nos pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural. Foram utilizadas entrevistas estruturadas, semiestruturadas e o dispositivo metodológico da autoconfrontação. Os dados, produzidos no período de fevereiro a abril de 2022, foram interpretados por meio da análise microgenética proposta por Vigotski. Participaram da pesquisa duas professoras de turmas inclusivas dos anos iniciais do Ensino Fundamental de uma escola municipal de Pinhais (PR). A análise dos dados foi estruturada a partir dos objetivos específicos propostos para a investigação empírica: identificação das emoções das participantes frente à inclusão escolar; discussão das relações entre as emoções e práticas docentes inclusivas; e promoção de possibilidades de transformação do trabalho docente por meio da tomada de consciência das emoções. Foi incluído um quarto tópico de análise com outras questões emergentes durante a realização da pesquisa. A pesquisa identificou a dificuldade das professoras em expressar e referirem-se às próprias emoções, reverberando o modelo cartesiano que relega as emoções em detrimento da cognição. Embora tenham sido mencionadas emoções como amor/gostar e esperança, os resultados revelaram a ampla presença de emoções desagradáveis (angústia; desamparo, aflição, impotência; frustração; incapacidade, insegurança; incompletude; sentir-se mal; tristeza). As professoras expressaram-se em relação a especificidades da inclusão escolar, tais como: a preocupação com a aprendizagem e o desenvolvimento do estudante, para além de sua inserção no ambiente físico da escola; a adaptação das atividades pedagógicas no atendimento às necessidades educacionais específicas; as contribuições da classe especial no desenvolvimento do estudante; a importância do apoio ao professor e do trabalho colaborativo na perspectiva inclusiva; a necessidade de valorização do trabalho docente e da implementação de políticas públicas para a inclusão. O adoecimento docente devido à sobrecarga de trabalho e à falta de apoio na efetivação da inclusão escolar, especialmente no contexto da pandemia da covid-19, foi enfatizado por ambas as participantes. Por meio da entrevista de autoconfrontação, as professoras puderam reconhecer e refletir sobre suas emoções/práticas inclusivas se amalgamam no cotidiano da escola. Por meio desse processo de tomada de consciência sobre o real de sua atividade, as professoras são capazes de (re)conhecer suas emoções/práticas e configurar novos sentidos às suas vivências, fortalecendo seu poder de agir.

Abstract: This research gathered contributions from Lev S. Vygotsky, Yves Clot, and Michel de Certeau, with the general objective of understanding the development process of emotions and their transformation in inclusive teaching practices. We defend that the awareness of emotions concerning school inclusion promotes a transformation that can generate changes in the development process; thus, recognizing and resignifying the emotions that permeate and compose the practices, promoting the transformation of the work activity, and legitimating the teacher's power to act in the school's daily life. It is a qualitative exploratory and interpretative research based on the assumptions of Cultural-Historical Psychology. Structured and semi-structured interviews were used, as well as the methodological device of self-confrontation. The data produced from February to April 2022 were interpreted employing the microgenetic analysis proposed by Vygotsky. Two teachers of inclusive classes in the early years of elementary education from a municipal school in Pinhais (PR) participated in the research. Data analysis was structured based on the specific objectives proposed for the empirical investigation: identification of the participants' emotions towards school inclusion, discussion of the relationship between emotions and inclusive teaching practices, and promotion of possibilities of transforming the teaching work through awareness of emotions. We included a fourth analysis topic with other issues emerging during the research. The research identified the teachers' difficulty in expressing and referring to their own emotions, reverberating the Cartesian model that relegates emotions to the detriment of cognition. Although emotions such as love/like and hope were mentioned, the results revealed the vast presence of unpleasant emotions (anguish; helplessness, affliction, impotence; frustration; incapacity, insecurity; incompleteness; feeling bad, sadness). The teachers expressed themselves concerning the specifics of school inclusion, such as: the concern with the learning and development of the student beyond his insertion in the physical environment of the school; the adaptation of pedagogical activities to meet the specific educational needs; the contributions of the special class in the development of the student; the importance of support for the teacher and collaborative work in the inclusive perspective; the need to value the teaching work and the implementation of public policies for inclusion. The teacher's illness due to work overload and lack of support in the effectiveness of school inclusion, in the context of the covid-19 pandemic especially, was emphasized by both participants. Through the self-confrontation interview, the teachers could recognize and reflect on their inclusive emotions/practices amalgamated in the school's daily life. Through this process of becoming aware of the reality of their activity, the teachers can (re)know their emotions/practices and give new meaning to their experiences, strengthening their power to act.