Critérios de análise e utilização das contribuições recebidas por pacientes em consultas públicas da Conitec : o caso dos moduladores para fibrose cística
Resumo
Resumo: A fibrose cística (FC) é uma doença genética rara que afeta principalmente os pulmões, pâncreas e sistema digestório. É ocasionada por uma mutação no gene cystic fibrosis transmembrane conductance regulator (CFTR), que codifica a proteína CFTR, responsável pela formação do canal transmembranar de condutância de cloro. Por consequência, o muco do organismo torna-se mais espesso e de difícil eliminação, causando sintomas como tosse crônica, dificuldade para ganhar peso e estatura. Triada no teste do pezinho e confirmada no teste do suor e através de exames genéticos, ela não é mais descrita como uma "doença da infância", graças aos avanços em saúde da última década, como os medicamentos moduladores da proteína CFTR, que podem corrigir ou melhorar a função da proteína CFTR, reduzindo sintomas e melhorando a qualidade de vida. Bem como outros medicamentos, os moduladores são considerados "tecnologias em saúde". Para que sejam disponibilizadas para a população através dos sistemas públicos, faz-se necessária uma criteriosa apreciação sobre dados como eficácia e custos, além da análise de evidências de vida real obtidas através de relatos de pacientes. Este processo de análise é chamado de Avaliação de Tecnologias de Saúde (ATS) e, globalmente, várias agências de ATS reconhecem a importância de se levar em consideração a perspectiva do paciente. No Brasil, a ATS é conduzida pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) e a participação social se dá, também, através de consultas públicas (CPs). Contudo, nem sempre é claro como tais relatos de experiência de pacientes são analisados e considerados pelos tomadores de decisão. Neste estudo de caso exploratório buscou-se identificar quais foram as metodologias utilizadas pelos avaliadores para analisar as contribuições de pacientes do formulário de experiência e opinião de três consultas públicas de moduladores para fibrose cística, e como foram utilizadas e consideradas durante o processo de tomada de decisão. Foram analisadas as seguintes CPs: nº 37/2020 (lumacaftor/ivacaftor - M1); CP nº 38/2020 (ivacaftor - M2); CP nº 05/2022 (tezacaftor/ivacaftor - M3). Foram analisadas as planilhas oficiais dos formulários de experiência e opinião das referidas CPs e identificados relatos de pacientes com evidência de uso dos medicamentos. Após, foram apreciados os vídeos das reuniões em que se apresentou tais resultados das CPs, buscando-se identificar como estas contribuições foram analisadas, apresentadas e se foram consideradas pelos membros da plenária. Embora tenham sido encontrados relatos de pacientes com evidência do uso das tecnologias nos três formulários das CPs, não se observou a apresentação destes relatos durante a reunião de apreciação dos resultados da CP do M1 e M2, e a metodologia de análise utilizada invisibilizou os depoimentos dos pacientes. Por mais que tenha sido observada uma metodologia mais delineada na reunião do M3, bem como a apresentação de dois relatos com evidência de uso da tecnologia, não se notou uma discussão sobre esses dados pelos membros da plenária. Conclui-se que os relatos de pacientes com evidência de uso das três medicações em avaliação não influenciaram na decisão final. Observou-se uma fragilidade na metodologia de análise dessas contribuições em duas CPs e uma ausência de processo formal de utilização e discussão destes relatos, quando foram apresentados. Destaca-se uma necessidade de rediscussão dessas metodologias para que a experiência da sociedade seja apresentada, utilizada e considerada de forma mais efetiva em ATS, garantindo a credibilidade do processo de tomada de decisão para a incorporação de tecnologias em saúde no SUS. Abstract: Cystic Fibrosis is a genetic disease which affects mainly the lungs, pancreas, and the digestive system. It is caused by a mutation on the gene cystic fibrosis transmembrane conductance regulator (CFTR), which codifies the CTFR protein responsible for the formation of the transmembrane chlorine conductance channel. Due to this mutation, there is accumulation of dense mucus in the organism making difficult to eliminate it and causing several symptoms such as chronic cough, difficulty in gaining weight and height, etc. Being screened on the guthrie test (neonatal heel prick) and confirmed by the sweat test and through genetic exams, it is no longer described as a "childhood condition" thanks to the advances of this last decade such as the modulators of the CFTR protein, which can correct or improve the function of the CFTR protein reducing symptoms and improving the quality of life. Just as other medications, the modulators are considered "health technologies". For these medications to be made available to the population through public systems, it is necessary to establish a thorough assessment about data such as efficiency and costs, besides the analysis of evidences in real life obtained through patient reports. This analysis process is called Health Technologies Assessment (HTA) and, globally, several HTA agencies recognize the importance of taking into consideration the patient's perspective. In Brazil, HTA is conducted by Conitec (National Committee of Technology Incorporation in SUS) and the social participation also happens through public consultations (PCs). However, is not always clear how such reports of patients' experiences are analyzed and considered by the decision makers. In this explanatory case study we sought to identify which were the methodologies employed by the assessor to analyze the contributions of patients from the experience and opinion form in three public consultations of modulators for cystic fibrosis and how they were employed and considered during the decision-making process. The following PCs were analyzed: PC #37/2020 (lumacaftor/ivacaftor - M1); PC #38/2020 (ivacaftor - M2); PC #05/2022 (tezacaftor/ivacaftor - M3). We analyzed the official spreadsheets of the experience and opinion forms of the referred PCs and identified reports of patients with evidence of use of the medications. Afterwards we evaluated videos of the meeting in which such results of the PCs were presented seeking to identify how these contributions were analyzed, presented and if they were considered by the members of the session. Although patients' reports were found with evidence of use of the technologies on the three forms of the PCs, we did not observe the presentation of these reports during the result assessment meeting for M1 and M2 PC, and the methodology of analysis employed made the patients' statements unknown. Regardless the fact that a more outlined methodology was observed in M3 meeting, as well as the presentation of two reports with evidence of use of the technology, we did not observe a discussion about these data. The conclusion is that the patients' reports with evidence of use of the three medications being assessed did not influence the final decision. We observed a vulnerability in the methodology of analysis of these two contributions in two PCs and an absence of a formal process of utilization and discussion of these reports when presented. We emphasize the need of review for these methodologies so that society's experience may be presented, utilized, and considered in the most effective way in HTA, ensuring the credibility of the decision-making process for the incorporation of health technologies in SUS.
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