Entre o Fiagro e os investidores individuais : o fetiche de ser sócio do agro pelo mercado de capitais

Abstract

Resumo: Esta dissertação induz à reflexão sobre a possibilidade de participação de cidadãos urbanos que não são donos de terras ou agroindústrias à repartição de lucros do agronegócio. O Fundo de Investimento das Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro) foi criado em 2021 com a finalidade de incluir qualquer indivíduo ou empresa no circuito de dívidas e rendimentos do setor. A promessa é de que, através do mercado de capitais, investidores do tipo pessoa física e pouco capitalizados receberão dividendos das atividades do campo. Em dois anos e meio de operação, o Fiagro foi sustentado pelo investidor individual de varejo, sujeito que, sozinho, não é capaz muitas vezes de comprar a casa própria, mas, em coletividade, poderia financiar cadeias produtivas de commodities. Este trabalho tem como objetivo descrever o fenômeno "Fiagro" por meio de sujeitos, instituições, dispositivos digitais e financeiros, e símbolos que promovem o funcionamento de uma nova estratégia de financeirização do agronegócio no Brasil. Trata-se de um estudo exploratório a partir da Teoria Ator-Rede (ANT), que pretende apresentar as possíveis conexões entre as noções de neoliberalismo, de financeirização da vida cotidiana e os conceitos marxistas de fetichismo da mercadoria e alienação. Os dados de pesquisa se concentraram em entrevistas com investidores e operadores do Fiagro por meio da amostragem bola de neve, da observação de redes sociais e de grupos de mensagens por aplicativo, além da análise de dados públicos quantitativos. O trabalho aponta para o agenciamento de ações político-econômicas, como a retirada de direitos trabalhistas e a diminuição da percepção de bem-estar social; as formas de mediação pelos dispositivos digitais; a internalização do discurso de liberdade individual e a fetichização da noção de "sócio do agro" como objetos privilegiados de observação de uma nova dinâmica social da relação entre o mundo rural e urbano, mediado pelo mercado de capitais.

Abstract: This dissertation prompts reflection on the possibility of urban citizens who don't own land or agribusinesses participating in the distribution of agribusiness profits. The Investiment Fund in Agroindustrial Productive Chains (Fiagro) was created in 2021 with the aim of including any natural person or company in the sector's debt and income circuit. The promise is that, through the capital market, individual investors with limited capital will receive dividends from rural activities. In the two and a half years it has been in operation, Fiagro has been sustained by individual retail investors, who alone are often unable to buy their own houses, but who, collectively, could fund commodity production chains. The aim of this work is to describe the "Fiagro" phenomenon through the subjects, institutions, digital-financial devices and symbols that promote the functioning of a new agribusiness financialization strategy in Brazil. This exploratory study is based on the Actor-Network Theory (ANT), which aims to present the possible connections between the notions of neoliberalism, the financialization of everyday life and the Marxist concepts of commodity fetishism and alienation. The research data focused on interviews with investors and operators of Fiagro through snowball sampling, observation of social networks and group messaging apps, as well as analysis of quantitative public data. The work points to the agency of political-economic actions, such as the withdrawal of labour rights and the reduction of the perception of social welfare; the forms of mediation by digital devices; the internalization of the discourse of individual freedom and the fetishization of the notion of being a "partner in agribusiness" as privileged objects of observation of a new social dynamic of the relationship between the rural and urban worlds, mediated by the capital market.