O cadastro socioeconômico dos atingidos por barragens instituído pelo decreto nº 7.342/2010 : conquista e limites de sua aplicação
Resumo
Resumo: As barragens construídas no Brasil para atender a demanda de produção de energia elétrica por meio de usinas hidrelétricas trazem impactos negativos ambientais e sociais significativos. O objetivo geral desta pesquisa é averiguar o processo que conduziu à aprovação do Decreto nº 7.342/2010 que instituiu a obrigação de realizar um Cadastro Socioeconômico da população atingida pela implantação de empreendimentos hidrelétricos, e em que medida e forma foi implementado até o presente se configurando, ou não, como efetivo instrumento de proteção e salvaguarda dos direitos dos atingidos. A relevância do tema justifica-se, pois, em virtude do sistemático deslocamento compulsório das populações atingidas ao longo de várias décadas de implantação de usinas hidrelétricas no Brasil, com ocorrência de recorrente violação de direitos humanos, e de reparações efetuadas pelos empreendedores que não reconhecem o valor real -material e simbólico- dos ambientes naturais e construídos, assim como da cultura e modos de vida que são destruídos ou afetados pela implantação dos empreendimentos. Este problema tende a se perpetuar e ampliar, já que o governo federal prevê a expansão da oferta de energia de matriz hidrelétrica. A metodologia da pesquisa indagou sobre a criação e aplicação do Decreto através de revisão bibliográfica, análise documental, levantamento de dados de sites institucionais e entrevistas a informantes qualificados, no caso, de órgãos ambientais, do Ministério de Minas e Energia e do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). Os resultados da pesquisa mostram que a luta dos atingidos em prol do reconhecimento e garantia dos seus direitos teve papel fundamental na criação do Decreto nº 7.342/2010, constituindo um avanço histórico, porém, desde a sua promulgação, o Cadastro Socioeconômico não se configurou efetivamente num instrumento de reconhecimento e salvaguarda dos direitos dos atingidos. Do ponto de vista instrumental, isto acontece pelo fato do Cadastro não ser exigido nos processos de licenciamento de empreendimentos hidrelétricos pelos órgãos ambientais estaduais, como no caso do Paraná, e, no caso dos licenciamentos ambientais federais conduzidos pelo IBAMA, que sim o exigem, pelo fato de ser elaborado por técnicos contratados pelos próprios empreendedores, o que tende a conferir parcialidade, limitando a inclusão de atingidos. Verificou-se também que não existem ações governamentais consistentes que deem maiores garantias jurídicas aos futuros atingidos por barragens. As conquistas obtidas até os dias atuais, advindas das mobilizações do MAB, ainda que muitas e importantes, não conseguiram evitar ou amenizar na medida necessária o processo de desestruturação-reestruturação das vidas das populações atingidas. Uma análise mais profunda remete ao retrocesso das causas ambientais e sociais na sociedade brasileira, num contexto de grande pressão por parte de poderosos setores econômicos nacionais e estrangeiros, ávidos por se apropriar sem limites de mais recursos naturais e usá-los para seus fins e uma condução governamental que os protege e favorece. Assim, a conclusão geral do trabalho é que a não aplicação do cadastro em questão, ou sua aplicação limitada, é mais uma forma de falta de reconhecimento dos direitos dos atingidos por barragens e que, por sua vez, este é mais um caso de uma tragédia bem maior de retrocesso ambiental e social geral que tende a se firmar e piorar, e que só poderá ser revertida no processo histórico onde as lutas em defesa da natureza e dos direitos sociais se liguem e fortaleçam ao ponto de conseguir mudar a atual correlação de forças desfavorável. Palavras chave: atingidos por barragens; cadastro socioeconômico; avaliação de impacto ambiental. Abstract: The dams built in Brazil to meet the demand for electricity generation through hydroelectric plants bring significant negative environmental and social impacts. The general objective of this research is to investigate the process that led to the approval of Decree No. 7.342 / 2010, which established the obligation to carry out a Socioeconomic Register of the population affected by the implementation of hydroelectric projects, and to what extent and form was implemented until the present time, - or not - as an effective instrument of protection and protection of the rights of those affected. The relevance of the theme is therefore justified by the systematic compulsory displacement of the populations affected during several decades of implementation of hydroelectric plants in Brazil, with the occurrence of a recurrent violation of human rights, and of repairs carried out by entrepreneurs who do not recognize the real value - material and symbolic - of the natural and built environments, as well as of the culture and ways of life that are destroyed or affected by the implementation of the projects. This problem tends to perpetuate and expand, as the federal government plans to expand the supply of hydroelectric power. The research methodology investigated the creation and application of the Decree through bibliographic review, documentary analysis, data collection of institutional sites, and interviews with qualified informants, in the case of environmental agencies, Ministry of Mines and Energy and the Movement of Dam Affected People. The results of the research show that the struggle of those affected for the recognition and guarantee of their rights played a fundamental role in the creation of Decree 7,342 / 2010, constituting a historic advance. However, since its promulgation, the Socioeconomic Register has not effectively set up an instrument to recognize and safeguard the rights of those affected. From an instrumental point of view, this is due to the fact that registration is not required in the licensing processes of hydroelectric projects by the state environmental agencies, as in the case of Paraná, and in the case of federal environmental licensing conducted by IBAMA, by the fact that it is prepared by technicians paid by the entrepreneurs themselves, which tends to confer bias, limiting the inclusion of those affected. It was also found that there are no consistent government actions that give greater legal guarantees to the future affected by dams. The achievements of the MAB mobilizations to date, although many and important, have not succeeded in avoiding or mitigating to the extent necessary the process of restructuring and restructuring the lives of the people affected. A deeper analysis refers to the retreat of environmental and social causes in Brazilian society, in a context of great pressure from powerful national and foreign economic sectors, eager to appropriate without limits more natural resources and use them for their ends and a governance that protects and favors them. Thus, the general conclusion of the work is that the non-application of the register in question, or its limited application, is another form of lack of recognition of the rights of those affected by dams and that this in turn is another case of a much greater tragedy of general environmental and social backwardness that tends to become worse and worse, and which can only be reversed in the historical process where struggles in defense of nature and social rights are consolidated and strengthened to the point of changing the current correlation of unfavorable forces. Keywords: affected by dams; socioeconomic register; environmental impact assessment.
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