Argumentos sobre as possibilidades da análise do comportamento enquanto ciência prescritiva de valores no âmbito da clínica
Resumo
Resumo: A tradicional separação entre fatos e valores na ciência consolidou uma prática psicológica marcada por uma suposta neutralidade ética. A análise do comportamento propõe uma abordagem funcional dos valores, entendendo-os como comportamentos determinados, passíveis de análise e intervenção. Embora abordagens clínicas contemporâneas — como a Green FAP, a Terapia Racial e a Terapia Feminista — incluam valores explícitos em suas práticas, persistem lacunas quanto à coerência filosófica dessas propostas e às implicações de adotar (ou recusar) prescrições éticas na ciência comportamental. Esta tese investigou a viabilidade da análise do comportamento como ciência prescritiva de valores na clínica, com base em seus fundamentos filosóficos e consequências práticas. Ao longo de três estudos, cinco questões principais foram exploradas: (1) Quais são as definições analítico-comportamentais de valores a partir do behaviorismo radical e contextualismo funcional? (2) Quais são seus pontos de convergência e divergência?; (3) A prescrição de valores seria coerente com esses sistemas filosóficos?; (4) Quais são os principais argumentos da defesa ou contra a análise do comportamento enquanto uma ciência prescritiva? (5) Quais seriam as possíveis implicações da sua adoção ou recusa a atuação clínica? O primeiro artigo, Values in Radical Behaviorism and Functional Contextualism: Agreement, Divergence, or Contradiction? comparou as concepções de valores nestas filosofias. Identificou-se um ponto de convergência, três divergências e três contradições – estas últimas, sobre o papel do controle social, o conceito de liberdade e suas teorias morais. Apesar de ambas as abordagens adotarem uma perspectiva funcionalista, suas divergências conceituais e implicações práticas são profundas, sugerindo incompatibilidades fundamentais. O segundo artigo, Problemas com a Definição dos Valores como "Livres" e "Intrínsecos" na Ciência Comportamental Contextual, examinou criticamente tais asserções. Avaliamos os significados das asserções para a CBS: valores "livres" seriam controlados predominantemente por reforçamento positivo e não por pliance; valores "intrínsecos" estariam relativamente isentos de controle externo direto e fariam parte de molduras hierárquicas. Foram expostas limitações nestas definições como a dificuldade de distinguir as fontes de controle propostas, a negligência de determinantes sociais e os critérios normativos implícitos. Alertou-se para o risco de que, ao aplicar técnicas de clarificação baseadas nessas definições, o terapeuta contribua para a manutenção de práticas culturais opressivas. O terceiro artigo, Possibilidades da Análise do Comportamento como Ciência Prescritiva de Valores no Âmbito da Clínica, avaliou a coerência filosófica e as implicações da prescrição ética na prática clínica. Foram discutidos argumentos contrários a tal prescrição, a saber: o risco da falácia naturalista, a imprevisibilidade do futuro e o temor do autoritarismo científico; e argumentos favoráveis: os problemas da prescrição implícita de valores na ACT, os limites do relativismo moral e os benefícios de um compromisso ético explícito. Concluiu-se que a prescrição de valores é coerente com os fundamentos pragmatistas da análise do comportamento e foram propostas soluções para os problemas elencados nos argumentos desfavoráveis. Apontamos que, quando conduzida de forma crítica e dialogada, a prescrição explícita de valores pode fortalecer a liberdade, enquanto contracontrole, e ampliar o compromisso ético e a relevância social da análise do comportamento Abstract: The traditional separation between facts and values in science has consolidated a psychological practice marked by a supposed ethical neutrality. Behavior analysis proposes a functional approach to values, understanding them as determined behaviors that can be analyzed and intervened upon. Although contemporary clinical approaches - such as Green FAP, Racial Therapy and Feminist Therapy - include explicit values in their practices, gaps remain regarding the philosophical coherence of these proposals and the implications of adopting (or refusing) ethical prescriptions in behavioral science. This thesis investigated the viability of behavior analysis as a value-prescribing science in the clinic, based on its philosophical foundations and practical consequences. Over the course of three studies, five main questions were explored: (1) What are the behavior-analytic definitions of values from the viewpoint radical behaviorism and functional contextualism? (2) What are their points of convergence and divergence? (3) Would the prescription of values be coherent with these philosophical systems? (4) What are the main arguments for or against behavior analysis as a prescriptive science? (5) What would be the possible implications of its adoption or refusal for clinical practice? The first article, Values in Radical Behaviorism and Functional Contextualism: Agreement, Divergence, or Contradiction? compared the conceptions of values in these philosophies. It identified one point of convergence, three divergences and three contradictions - the latter concerning the role of social control, the concept of freedom and the epistemological status of values. Although both approaches adopt a functionalist perspective, their conceptual divergences and practical implications are profound, suggesting fundamental incompatibilities. The second article, Problems with Defining Values as "Free" and "Intrinsic" in Contextual Behavioral Science, critically examined such assertions. We evaluated the meanings of the assertions for CBS: "free" values would be controlled predominantly by positive reinforcement and not by pliance; "intrinsic" values would be relatively free of direct external control and would be part of hierarchical frames. Limitations of these definitions were exposed, such as the difficulty of distinguishing the proposed sources of control, the neglect of social determinants and the implicit normative criteria. We warned of the risk that by applying clarification techniques based on these definitions, the therapist contributes to the maintenance of oppressive cultural practices. The third article, Possibilities of Behavior Analysis as a Value Prescriptive Science in Clinical Practice, evaluated the philosophical coherence and implications of ethical prescription in clinical practice. Arguments against such prescription were discussed, namely: the risk of the naturalistic fallacy, the unpredictability of the future and the fear of scientific authoritarianism; and arguments in favor: the problems of the implicit prescription of values in ACT, the limits of moral relativism and the benefits of an explicit ethical commitment. We concluded that the prescription of values is coherent with the pragmatist foundations of behavior analysis and proposed solutions to the problems listed in the unfavorable arguments. We point out that, when conducted in a critical and dialogical manner, the explicit prescription of values can strengthen freedom, as a counter-control, and broaden the ethical commitment and social relevance of behavior analysis
Collections
- Teses [5]