Violência de gênero em Paranaguá (1970-1985) : o percurso judicial em casos de lesões corporais de homens contra suas companheiras
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Data
2024Autor
Policarpo, Layla Chaenny da Silveira
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Resumo: O presente trabalho tem como tema a violência de gênero contra mulheres praticada por seus companheiros. Portanto, refere-se à análise de 54 processos-crime de lesões corporais cometidos por homens contra suas parceiras, classificados pelo Art. 129 do Código Penal de 1940, e instaurados no período de 1970 até 1985 em Paranaguá, região litorânea e portuária do Estado do Paraná. A partir da análise foucaultiana do discurso, analisamos as narrativas presentes nos autos dos processos, isto é, as declarações das testemunhas, dos acusados e das mulheres agredidas, para compreendermos as explicações sugeridas por estes para as situações de violência, as expectativas e as frustrações desses sujeitos, as ambiguidades e as concepções sobre violência na relação conjugal. Mas, também, partimos da análise das declarações dos agentes jurídicos para entendermos como a violência é traduzida no campo jurídico, que concepções de violência apresentam, quem é considerada vítima, sendo que ora é o agressor, ora é a mulher agredida e quais teses geralmente lançam mão para acusar, defender, punir/absolver. Além disso, destacamos como as rupturas em relação à legitimação da violência se faz presente. A partir do conceito de violência relacional desenvolvido por Gregori e pela perspectiva da teoria ecológica, concebemos a violência de gênero contra as mulheres como algo multifacetado, relacional e que não pode ser entendido a partir de apenas uma ou outra justificativa, como queriam os envolvidos e agentes jurídicos. Além disso, embora não tivéssemos à nossa disposição uma lei direcionada à coibição e à punição de violências direcionadas às mulheres, analisamos como o delito de lesões corporais (art. 129) previsto pelo Código Penal de 1940, que prevê como quebra da norma penal a prática de ofensa à integridade física de alguém, é traduzido nos autos dos processos analisados ora como expressão do comportamento rude do parceiro agressor, ora como um simples "incidente doméstico", resultado de brigas entre marido e mulher, e que é motivado pelo mau comportamento da mulher, pelo abuso de consumo de álcool do agressor, entre outras. Ao analisar como os agentes jurídicos lidavam com os casos, foi possível constatar que os mesmos não viam tais denúncias como prática configurada como crime que merece ser punido como prevê a lei, mesmo para os casos em que a autoria do delito é comprovada. Dito isso, ao percorrer a leitura e análise de 54 processos produzidos ao longo de quinze anos, em um contexto de grande denúncia da violência de gênero contra as mulheres, nos deparamos com muitas continuidades em relação à invisibilização do fenômeno, mas também observamos rupturas, mesmo que tímidas, na forma como as mulheres agredidas conferem significado próprio às experiências que sofrem, ao se negarem permanecer na relação violenta, mas também na forma como alguns acusadores e juízes dispensam atenção ao depoimento dessas mulheres, validando-os com base em uma crítica à violência direcionada a elas. Abstract: The subject of this study is gender-based violence against women committed by their partners. Therefore, it refers to the analysis of 54 criminal cases of bodily harm committed by men against their partners, classified under Art. 129 of the 1940 Penal Code and filed between 1970 and 1985 in Paranaguá, a coastal and port region in the state of Paraná. Using Foucauldian discourse analysis, we analyzed the narratives in the case files, i.e. the statements made by witnesses, the accused and the battered women, in order to understand the explanations they suggested for the situations of violence, their expectations and frustrations, their ambiguities and their conceptions of violence in the marital relationship. But we also started by analyzing the statements made by legal agents to understand how violence is translated in the legal field, what conceptions of violence they present, who is considered a victim, sometimes the aggressor, sometimes the battered woman, what theses they generally use to accuse, defend, punish/abolish. But also how ruptures in relation to the legitimization of violence are present. Based on the concept of relational violence developed by Gregori and from the perspective of ecological theory, we conceive of gender-based violence against women as something multifaceted, relational and that cannot be understood from just one or another justification, as those involved and legal agents would like. Furthermore, although we did not have a law at our disposal aimed at curbing and punishing violence against women, we analyzed how the crime of bodily injury (art. 129) provided for in the 1940 Penal Code, which stipulates that offending someone's physical integrity is a breach of the penal norm, is translated in the case files analyzed as either an expression of the aggressive partner's rude behavior, or perceived as a simple "domestic incident", the result of fights between husband and wife, and which is motivated by the woman's bad behavior, the aggressor's abuse of alcohol, among others. When analyzing how legal agents dealt with the cases, it was possible to see that they did not see such complaints as a crime that deserves to be punished as the law provides, even in cases where the perpetrator is proven. That said, by reading and analyzing 54 cases produced over fifteen years, in a context of widespread denunciation of gender violence against women, we found many continuities in relation to the invisibilization of the phenomenon, but we also observed ruptures, albeit timid, in the way battered women give their own meaning to the experiences they suffer by refusing to remain in the violent relationship, but also in the way some prosecutors and judges pay attention to the testimony of these women, validating them based on a criticism of the violence directed at them.
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