Implementação do programa da OMS de treinamento de habilidades para pais e cuidadores de crianças com transtorno do espectro autista ou outros transtornos e atraso do neurodesenvolvimento, no Brasil

Abstract

Resumo: A prevalência dos transtornos do neurodesenvolvimento tem aumentado consideravelmente nas últimas décadas e representam um desafio para a saúde pública. Isto porque podem acarretar prejuízos significativos no desenvolvimento da criança e na qualidade de vida de seus familiares. A intervenção precoce e intensiva é preconizada pela literatura, apesar de seu custo elevado. Em países de baixa e média renda há uma lacuna de tratamento para crianças com esta condição e o treinamento parental demonstra ser uma alternativa viável e eficaz de suprir esta demanda. A Organização Mundial da Saúde (OMS), em parceria com a Autism Speaks, desenvolveu o Caregiver Skills Training (CST), programa voltado para países em desenvolvimento que visa a melhor utilização dos recursos disponíveis nos serviços públicos locais. O público alvo são famílias de crianças, de 2 a 9 anos, com atraso ou Transtorno do Neurodesenvolvimento (TN), especialmente o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Este estudo é parte da validação do programa para o Brasil e objetivou implementar e avaliar o pré piloto do CST visando a adaptação para a realidade sociocultural brasileira. A coleta de dados incluiu medidas de viabilidade e aceitabilidade, com cuidadores (n = 7) eMasterTrainers (n = 4), tanto quantitativas descritivas quanto qualitativas. No que se refere às quantitativas, houve permanência de 70% das famílias, com a participação média nas sessões de 86,90%. Obteve-se melhora em 100% das metas da "Medida de comportamentos-alvo". No "Formulário de Avaliação Pós-Sessão" (pontuação de 1 a 5) a mediana das respostas dos cuidadores foram: compreensibilidade (5), relevância (5) e utilidade (5); a mediana das pontuações dos Master Trainer sobre os cuidadores foram: concordância com as ideias (5), engajamento (4), relevância dos conteúdos (5) e aceitabilidade (5). A média de "fidelidade de implementação" (pontuação de 1 a 3) foi de 2,71. Na análise qualitativa, cujo conteúdo foi obtido pela técnica de grupo focal e analisado pela Classificação Hierárquica Descendente (CHD), cinco temas foram desenvolvidos a partir dos dados do cuidador: (1) desenvolvimentodas habilidades da criança (19,8%), (2) os desafios da inclusão e tratamentos (17,9%), (3) entendimento (17%), (4) apoio aos cuidadores (21,7%) e (5) mudanças no comportamento dos cuidadores (23,6%). Cinco categorias temáticas emergiram dos dados dos Master Trainers: (1) conquistas (20%), (2) método (21,7%), (3) organização e planejamento (13,3%), (4) atividade de campo (21,7%) e (5) suporte (23,3%). Houve consonância entre as análises qualitativa e quantitativa, as quais demonstram que a implementação do CST no Brasil é viável, aceitável erelevante, e que o treinamento da OMS atende a uma necessidade local. Os participantes indicaram que as sessões em grupo e as visitas domiciliares foram aceitas e valorizadas, sem barreiras socioculturais a esse formato de treinamento. Eles apontaram que questões práticas são os principais obstáculos à participação no treinamento e que a organização das apostilas e a supervisão dos Master Trainers precisa ser aprimorada. O teste do programa demonstrou mudanças positivas nos cuidadores, criação de uma rede de apoio e melhora dos sintomas no TD, como comunicação, interação social, autocuidado e de problemas comportamentais.

Abstract: The prevalence of neurodevelopmental disorders has increased considerably in recent decades and represents a challenge for public health. This is because they can cause significant losses in the child's development and in the quality of life of their family members. Early and intensive intervention is recommended by the literature, despite its high cost. In low- and middle-income countries there is a treatment gap for children with this condition and parental training proves to be a viable and effective alternative to meet this demand. The World Health Organization (WHO), in partnership with Autism Speaks, developed Caregiver Skills Training (CST), a program aimed at developing countries that aims to make the best use of resources available in local public services. The target audience is families of children, from 2 to 9 years old, with delay or DD, especially ASD. This study is part of the program validation for Brazil and aimed to implement and evaluate the CST pre-pilot aiming at adapting to the Brazilian socio-cultural reality. Data collection included measures of viability and acceptability, with caregivers (n = 7) and Master Trainers (n = 4), both quantitative, descriptive and qualitative. With regard to the quantitative, 70% of the families stayed, with the average participation in the sessions of 86.90%. There was an improvement in 100% of the goals of the "Measure of target behaviors". In the "Post-Session Evaluation Form" (score from 1 to 5) the median of the caregivers' responses were: comprehensibility (5), relevance (5) and usefulness (5); the median of scores Master Trainer on caregivers were: agreement with ideas (5), engagement (4), relevance of content (5) and acceptability (5). The average "implementation fidelity" (score from 1 to 3) was 2.71. In the qualitative analysis, whose content was obtained by the focus group technique and analyzed by the Descending Hierarchical Classification (CHD), five themes were developed from the data of the caregiver: (1) development of the child's skills (19.8%), (2) the challenges of inclusion and treatments (17.9%), (3) understanding (17%), (4) support for caregivers (21.7%) and (5) changes in the behavior of caregivers (23.6% ). Five thematic categories emerged from the data of Master Trainers: (1) achievements (20%), (2) method (21.7%), (3) organization and planning (13.3%), (4) field activity (21.7%) and (5) support (23.3%). There was a consonance between qualitative and quantitative analysis, which demonstrates that the implementation of CST in Brazil is feasible, acceptable and relevant, and that WHO training meets a local need. Participants indicated that group sessions and home visits were accepted and valued, with no socio-cultural barriers to this training format. They pointed out that practical issues are the main obstacles to participation in training and that the organization of handouts and the supervision of Master Trainers needs to be improved. The program test demonstrated positive changes in caregivers, creation of a support network and improvement of symptoms in DD, such as communication, social interaction, self-care and behavioral problems.