dc.description.abstract | Resumo: O presente estudo analisa o discurso sobre a caridade como veículo de legitimaçao do poder episcopal na Antigüidade Tardia. Essa utilizaçao foi possível graças a transformaçao do ideal caritativo imperial romano, conhecido como evergetismo, para um modelo cristao de caridade. Neste, dado o monopólio da intercessao divina que possuíam as hierarquias eclesiásticas, foi possível fomentar um elaborado circuito de donativos cujo maior beneficiário era o próprio clero. De fato, além de apropriarem-se da maior parte das doaçoes, as hierarquias eclesiásticas também verificavam um aumento em seu poder ideológico, uma vez que sua auctoritas era projetada sobre toda a sociedade – ricos e pobres. Assim, percebe-se que a valorizaçao ideológica do pobre, como categoria social em si plena de sentido, atendeu, em parte, aos propósitos de projeçao de poder das hierarquias eclesiásticas. Estudamos mais detalhadamente o caso da cidade de Emerita, fundamentados nas Vidas dos Santos Padres de Mérida, obra redigida por um anônimo diácono dessa cidade por volta do ano 633 com o objetivo de exaltar a memória de seus bispos. Ainda que nao se possa aferir a veracidade do relato, fica evidente em tal fonte a relaçao entre caridade e poder episcopal, entendida como um pressuposto para o autor e, por conseguinte, para seus interlocutores. Dessarte, notamos que conforme determinado bispo houvesse enfrentado maiores contestaçoes ao seu poder, maior foi a necessidade do anônimo autor de exaltar as obras de
caridade desse bispo com o intuito de legitimar sua política episcopal. Portanto, o autor
buscou, ao enaltecer as supostas obras caritativas desses bispos, centralizar o poder local na
figura do bispo católico de Mérida, independentemente de quem ocupasse a cátedra episcopal.
Assim, o discurso caritativo cristao, muito mais do que mero amor ao próximo, refletiu a
necessidade de legitimaçao e afirmaçao do poder episcopal na Antigüidade Tardia | pt_BR |