O bem versus o mal : fake news como arma das batalhas morais em disputa nas guerras culturais

Abstract

Resumo: Esta pesquisa investiga o papel das fake news como recurso argumentativo e audiovisual na construção e reforço de crenças em disputas morais no contexto das guerras culturais. Parte do pressuposto de que conteúdos falsos não apenas desinformam, mas também operam como dispositivos de mobilização política e identitária, reforçando visões de mundo polarizadas. O objetivo principal é analisar como diferentes grupos etários e com distintos alinhamentos políticos percebem, interagem e mobilizam fake news em suas práticas cotidianas de comunicação política. A abordagem metodológica é qualitativa e foi conduzida por meio de dois eixos principais: a análise de conteúdo de peças de fake news catalogadas em agência de checagem brasileira nos anos de 2022 e 2023; e a realização de 12 grupos focais com participantes organizados por faixa etária (18 a 30, 31 a 40, 41 a 50 e 51 a 65 anos) e por espectro político (Esquerda, Centro e Direita), com apoio da análise temática. O estudo adota a caracterização de fake news proposta por Dourado (2021), que compreende elementos como postulação factual, sentido de notícia, informação inverídica, múltiplos formatos, circulação multiplataforma e multi-versões. Os resultados indicam que a disseminação de fake news está profundamente enraizada em disputas morais e emocionais, sendo catalisadora das guerras culturais e frequentemente impulsionada por conteúdos que mobilizam temas sensíveis como religião, gênero, política e valores familiares. Observou-se que o compartilhamento de conteúdos falsos nem sempre é ingênuo ou acidental, constituindo-se como um ato deliberado de afirmação de identidade e alinhamento ideológico. As redes sociais e aplicativos de mensagens emergem como principais vetores de circulação, com destaque para o papel das bolhas informacionais e das câmaras de eco. As análises revelam ainda padrões distintos de comportamento informacional entre os grupos, visto que enquanto participantes de Direita tendem a confiar em fontes alternativas e rejeitar a grande mídia, os de Esquerda demonstram maior adesão à imprensa tradicional; já os participantes do Centro oscilam entre desconfiança generalizada e busca de moderação. Além disso, a pesquisa evidenciou nuances geracionais na forma de lidar com as fake news, apontando que diferentes faixas etárias adotam estratégias distintas de verificação, compartilhamento e interpretação dos conteúdos. Ao explorar a articulação entre desinformação e guerras culturais, esta pesquisa contribui para o avanço do conhecimento no campo da comunicação política, oferecendo subsídios empíricos e teóricos para o enfrentamento da desinformação e para o fortalecimento da esfera pública democrática no Brasil

Abstract: This research investigates the role of fake news as an argumentative and audiovisual resource in the construction and reinforcement of beliefs within moral disputes in the context of cultural wars. It is based on the premise that false content not only misinforms but also functions as a device for political and identity mobilization, reinforcing polarized worldviews. The main objective is to analyze how different age groups and political alignments perceive, engage with, and mobilize fake news in their everyday political communication practices. The methodological approach is qualitative and was developed through two main axes: content analysis of fake news cataloged by a Brazilian fact-checking agency in 2022 and 2023; and the conduction of 12 focus groups with participants organized by age range (18–30, 31–40, 41 50, and 51–65 years) and political orientation (Left, Center, and Right), supported by thematic analysis. The study adopts the characterization of fake news proposed by Dourado (2021), which includes elements such as factual postulation, news-like format, false information, multiple formats, cross-platform circulation, and multi-version dissemination. The findings indicate that the spread of fake news is deeply rooted in moral and emotional disputes, acting as a catalyst for culture wars and is often driven by content that addresses sensitive topics such as religion, gender, politics, and family values. The dissemination of false content is not always naïve or accidental; rather, it frequently represents a deliberate act of identity affirmation and ideological alignment. Social media and messaging apps emerge as the main channels of circulation, with a significant role played by information bubbles and echo chambers. The analysis also reveals distinct patterns of informational behavior among the groups: while Right-leaning participants tend to trust alternative sources and reject mainstream media, those on the Left show greater adherence to traditional journalism; participants in the Center, in turn, fluctuate between generalized distrust and a search for moderation. Furthermore, the study highlights generational nuances in the way individuals deal with fake news, showing that different age groups adopt distinct strategies for verification, sharing, and interpretation of content. By exploring the interplay between disinformation and cultural wars, this research contributes to the advancement of knowledge in the field of political communication, offering both empirical and theoretical insights for confronting disinformation and strengthening the democratic public sphere in Brazil