Abortamento legal : estudo de caso num hospital público do sul do país
Resumo
Resumo: Pesquisa realizada em torno da temática do abortamento previsto em lei, tendo como participantes mulheres acima de 18 anos que solicitaram o abortamento, no período de 2009 a 2015, junto ao Complexo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná. Trata-se de um estudo de caso, documental e descritivo, dividido em duas etapas: quantitativa e qualitativa. Teve por objetivos: conhecer a realidade objetiva dos casos de violência sexual contra mulheres que solicitaram o abortamento legal, notificados no Serviço de Epidemiologia Hospitalar no período de 2009 a 2015 e reconhecer os discursos expressos nos Termos de Relato Circunstanciado realizados na solicitação do abortamento legal, do mesmo período. Os dados foram coletados no período compreendido entre junho e dezembro de 2016. Na etapa quantitativa foram identificados 100 casos de violência sexual contra mulheres (que engravidaram) nas Fichas de Notificação Individual - Violência Interpessoal/Autoprovocada, tabulados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação - Sinan, no Serviço de Epidemiologia do CHC. A etapa qualitativa foi desenvolvida junto aos Termos de Relato Circunstanciados, documento no qual as mulheres relatam a violência sofrida bem como afirmam o desejo por interromper a gestação. Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva (etapa quantitativa) e pelo software webQDA (etapa qualitativa). Como resultados da primeira etapa destacamos: 91% das mulheres possuíam menos de 35 anos, 75% eram brancas, 52% solteiras. Em 42% dos casos a violência ocorreu no período das 19 às 23h, 51% das violências em via pública e em 75% dos casos o agressor era desconhecido. Na análise dos Termos de Relatos Circunstanciados,58 mulheres entregaram o documento, os quais foram digitados no software webQDA, possibilitando a identificação das 20 palavras mais frequentes encontradas nos relatos. A partir de tais palavras, foram elencadas frases em que se encontravam, representando as histórias de violência vividas pelas mulheres, bem como sentimentos, lembranças e temores. A literatura pesquisada subsidiou a discussão quanto a desigualdade histórica entre homens e mulheres e as relações em sociedade complexas e contraditórias. Conclui-se que a pesquisa trouxe uma importante reflexão quanto à violência sexual em mulheres, bem como sua relação com questões de gênero. Foi possível identificar a partir das falas destas mulheres, as relações de poder estabelecidas, interferindo diretamente nos comportamentos e condutas pós violência sexual, culminando em gestações indesejadas. As formas fortuitas de abordagem desses agressores, as ameaças perpetradas e a não procura destas mulheres por qualquer espécie de ajuda após a violência, demonstram o grande poder destes homens agressores, impactando nas decisões e encaminhamentos de tais situações. Os relatos destas mulheres sobre violência, o que sentiram, o que pensaram em fazer ou em não fazer, os temores que as assombraram, as lembranças, remetem a refletir a impossibilidade de julgamentos de situações tão complexas. Neste sentido, aos profissionais cabe o acolhimento, bem como o cuidado em não revitimizar as mulheres atendidas, por meio de condutas baseadas em suas percepções pessoais. O respeito por tais histórias e a prestação imediata da assistência como um todo nestes casos, é fundamental para minimizar as sequelas da violência. Descritores: delito sexual, violência contra a mulher, aborto, vigilância epidemiológica, exposição à violência. Abstract:This study was carried out around the topic of abortion provided for by law with women over 18 years of age as participants, who requested abortions from 2009 to 2015 at the Clinics Hospital Complex (CHC) of the Federal University of Paraná. This is a documentary and descriptive case study divided into two stages: a quantitative one and a qualitative one. The objective of the study was to know the objective reality of cases of sexual violence against women who requested legal abortion which were notified at the Hospital Epidemiology Service from 2009 to 2015, and to acknowledge the speeches expressed in the Terms of Detailed Accounts made on the requests for legal abortion of the same period. The data were collected between June and December 2016. In the quantitative stage, 100 cases of sexual violence against women (who became pregnant) were identified in the Individual Notification Records - Interpersonal/Self-inflicted Violence, charted in the Information System of Injury Notifications (Sinan), at the CHC Epidemiology Service. The qualitative stage was developed alongside the Terms of Detailed Accounts, a document in which women report the violence suffered as well as state the desire to interrupt their pregnancy. The data were analyzed through descriptive statistics (quantitative stage) and by the webQDA software (qualitative stage). As a result of the first stage, we highlighted: 91% of women were under 35 years of age, 75% were white, 52% were single. In 42% of cases, violence occurred in the period from 7:00 p.m. to 11:00 p.m., 51% were in public places and in 75% the perpetrator was unknown. In the analysis of the Terms of Detailed Accounts, 58 women delivered the document, which were typed in webQDA, making it possible to identify the 20 most frequent words found in the reports. Having these words as a starting point, some sentences where they appeared were selected to represent the stories of violence experienced by the women, as well as their feelings, memories and fears. The researched literature supported the discussion of historical inequality between men and women, and their complex and contradictory relationships in society. It is concluded that the research brought important reflection on sexual violence toward women as well as its relation to gender issues. It was possible to identify from the statements of these women the established power relations that interfere directly on behaviors and actions after the sexual violence that culminate in unwanted pregnancies. The fortuitous ways of these aggressors approaches, the perpetrated threats and the lack of a call for any kind of help by these women after the violence demonstrate the great power of these male assaulters, who have an impact on the decisions and referrals of such situations. The reports of these women about violence, what they felt, what they thought of doing or not, the fears that haunted them and their memories remind us of the impossibility of judging such complex situations. In this sense, it is up to the professionals to provide a safe haven as well as to make sure women are not revictimized by conducts based on their own personal perceptions. Respect for such stories and immediate provision of assistance as a whole, in these cases, is key to minimize the consequences of violence. Keywords: Sex offenses, violence against woman, abortion, epidemiological surveillance, exposure to violence.
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