Aranha marrom e loxoscelismo : revisão bibliográfica e ação sobre os tecidos hematopoiético e renal
Resumo
Esta tese está baseada na publicação de três artigos científicos os quais versam sobre a ação do veneno da aranha marrom (Loxosceles intermedia) sobre células da medula óssea e sangue periférico, utilizando como modelo animal coelhos. Ação do veneno da aranha marrom sobre o tecido renal, utilizando camundongos como modelo animal, tendo como enfoque a participação de células da medula óssea e do sangue periférico na nefrotoxicidade e uma revisão sobre loxoscelismo em um período compreendido entre 1993 e 2003. O objetivo do primeiro artigo publicado foi mostrar alterações celulares que ocorrem na medula óssea e sangue periférico de coelhos após a exposição aguda ao veneno da L. intermedia. Doses de 40 µg de proteínas do veneno (que corresponde a quantidade média de veneno inoculada pela aranha) foram injetadas na derme de 5 coelhos usando como controle outros 5 coelhos, tendo sido injetado nestes PBS, que também foi utilizado como solvente do veneno. Amostras de medula óssea e sangue periférico foram obtidas antes do envenenamento e 4, 8, 12, 24 e 48 horas e 5, 10, 15, 20 e 30 dias após o envenenamento. Na medula óssea observou-se a celularidade, células vermelhas nucleadas, megacariócitos e neutrófilos. No sangue periférico foi realizado o hemograma. O objetivo do trabalho foi verificar se o veneno tem um efeito direto sobre as células da medula óssea e sangue periférico, se as alterações são secundárias às necessidades teciduais e se há uma correlação entre a
histopatologia e os achados hematológicos após a exposição ao veneno. A série vermelha não foi afetada pelo veneno, somente os eritroblastos apresentaram um decréscimo. A depleção medular de megacariócitos teve uma boa correlação com a trombocitopenia periférica, a qual correlacionou-se com os achados histopatológicos, obtidos a partir de biópsias da pele de coelhos. A queda da celularidade e dos neutrófilos medulares correlacionou-se significativamente com as alterações neutrofílicas periféricas. A trombocitopenia e a neutropenia em
sangue periférico são devidas a depleção medular pela migração plaquetária e neutrofílica ao sítio inflamatório. Se o veneno tem um efeito direto sobre a medula óssea este foi transitório. No segundo trabalho publicado foi injetado intraperitonealmente 100 µl de veneno da L. intermedia diluído em PBS, equivalente a 1 mg de proteína/kg de peso, em 50 camundongos (grupo tratado). O grupo controle foi representado por 50 camundongos que receberam somente PBS. O camundongo foi utilizado como modelo animal pelo fato de não desenvolver lesão dermonecrótica, portanto qualquer lesão renal não pode ser atribuída a uma conseqüência secundária da lesão dermonecrótica. O objetivo do trabalho foi mostrar que o veneno induz diretamente o dano renal. Análises de biópsias renais ao microscópio óptico mostraram hialinização dos túbulos proximais e distais, eritrócitos nos espaços de Bowman’s, colapso glomerular, bolhas e vacúolos em células epiteliais celulares, edema intersticial e deposição de material eosinofílico no lúmen dos túbulos. O veneno causou aumento da concentração plasmática de uréia e não houve decréscimo da fração C3 do complemento. Não causou hemólise evidente "in vivo" porque não houve alteração da contagem de eritrócitos, da concentração de hemoglobina e determinação do hematócrito entre o grupo controle e o tratado. Também não foi evidenciada hemoglobinúria ou hematúria. Os dados experimentais apresentados evidenciam uma ação nefrotóxica direta do veneno da L. intermedia. O terceiro artigo publicado trouxe uma revisão sobre o loxoscelismo, nos últimos dez anos, enfocando a biologia e a epidemiologia da aranha marrom, os achados histopatológicos e alterações celulares após a exposição ao veneno. Mostra as toxinas identificadas e caracterizadas no veneno total, o mecanismo de desenvolvimento do quadro dermonecrótico e sistêmico causados pelo acidente com a aranha marrom, a imunogenicidade, as características clínicas, o diagnóstico e a terapia utilizada no tratamento do loxoscelismo. Por fim os produtos de biotecnologia já descritos e as proteínas clonadas até então This tesis is based in three papers. The purpose of the first work was
to find out the cellular changes occuring in bone marrow and peripheral blood after
acute exposure to the venom of Loxosceles intermedia. Doses of 40 ìg of venom
were injected intradermally into five rabbits, and five rabbits receiving only
phosphate-buffered saline (PBS) were used as controls. Bone marrow and
peripheral blood samples were obtained before the envenomation and 4, 8, 12, 24
and 48 h, and 5, 10, 15, 20 and 30 days after envenomation. In bone marrow
samples we assessed cellularity, nucleated red cells, megakaryocytes and
neutophils, and in peripheral blood we assessed red cells (red cell concentration,
hemoglobin and hematocrit), leukocytes, neutrophils and platelets. Our objective
was to find out if the venom has a direct effect on bone marrow and peripheral
blood or if changes in both of them are secondary to the needs of tissues, and if
there is a good correlation between histopathological and hematological findings.
We found that the red cell parameters were not affected by the venom, except for
nucleated red cells which decreased after venom exposure. The depression of
megacaryocyte numbers and thrombocytopenia showed a strong correlation with
the histopathological changes observed in skin biopsies obtained from the rabbits.
The changes in cellularity and neutrophils of bone marrow were strongly correlated
with those in peripheral blood and skin. The thrombocytopenia and neutropenia in
peripheral blood are due to marrow depression, which may be a consequence of
an extensive migration of platelets and neutrophils to the necrotic lesion or the
marrow depression may be a transitory effect of evenoming by L. intermedia.
In the second work mice were exposed to L. intermedia venom with
the aimed to show whether the venom directly induces renal damage. Mice were
used as animal model because they did not develop dermonecrotic lesion. The
experimental groups were composed of 50 mice as control and 50 mice that
received the venom. Light microscopic analysis of renal biopsy specimens showed
alterations including hyalinization of proximal and distal tubules, erytrocytes in
Bowman’s space, glomerular collapse, tubule epithelial cell blebs and vacuoles,
interstitial edema, and deposition of eosinophilic material in the tubule lumen. We
also found that the venom caused azotemia with elevation of blood urea levels but
did not decrease C3 complement concentration or cause hemolysis in vivo,
because neither red blood cell count, hemoglobin, or hematocrit values showed
significant differences between the venom-treated and control groups. No
hemoglobinuria or the presence of red blood cells in urine was observed. The data
provide experimental evidence that L. intermedia venom is directly involved in
nephrotoxicity.
The last work, a review, had the purpose to describe some insights
into loxoscelism obtained over the last ten years. The biology and epidemiology of
the brown spider, the histopathology of envenomation and the immunogenicity of
Loxosceles venom are reviewed, as well as the clinical features, diagnosis and
therapy of brown spider bites. The identification and characterization of some
toxins and the mechanism of induction of local and systemic lesions caused by
brown spider venom are also discussed. Finally, the biotechnological application of
some venom toxins are covered.
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