Efeito do canabidiol sobre a consolidação da memória de medo específica e generalizada, bem como sobre a persistência dessas memórias : uma abordagem preclínica em um modelo animal de diabetes mellitus tipo-1

Abstract

Resumo: Evidências indicam que muitos pacientes com diabetes mellitus tipo 1 (DM1) apresentam prejuízo no processamento das emoções, bem como da memória associada ao medo, demonstrado pela alta prevalência de transtornos relacionados ao estresse e/ou ansiedade. Com base na falta de tratamento eficaz dessas condições, particularmente nesses pacientes com DM1, o canabidiol (CBD), componente não psicotomimético da planta Cannabis sativa, tem-se destacado pelo seu potencial em melhorar diversas condições relacionadas com as emoções, bem como aspectos específicos associados ao diabetes mellitus. Assim, investigamos em animais com DM1 induzido experimentalmente se uma única injeção ou um tratamento mais prolongado (1 semana) com CBD (0, 10, 30 ou 60 mg/kg; ip) interferiria no processo de consolidação da memória de medo contextual (teste em contexto condicionado), bem como na sua generalização (teste em contexto neutro) e persistência (reavaliação dos animais 1 semana após). Além disso, os efeitos da injeção única de CBD sobre a consolidação da memória de medo também foram analisados através da expressão da proteína associada ao citoesqueleto regulada por atividade (Arc) no hipocampo dorsal (HD), uma importante área do cérebro relacionada à memória e processos emocionais. Também estudamos se esta injeção única com CBD interferiria em uma memória de curto prazo. A fim de avaliar se os efeitos eram exclusivamente associados ao processamento da memória de medo, após o tratamento prolongado com CBD também investigamos respostas comportamentais relacionadas com a ansiedade. Por fim, estudamos os efeitos dos tratamentos único ou contínuo com CBD em outros tipos de memórias não associadas ao medo, como memória de reconhecimento e localização de objetos, bem como memória espacial. Nossos dados demonstraram que uma única injeção de CBD foi capaz de prejudicar apenas a generalização da memória do medo, não sendo este efeito persistente quando animais foram reavaliados 1 semana após. O tratamento agudo com CBD não foi capaz de alterar a memória de medo contextual de curto prazo nesses animais com DM1 induzido em ambos os contextos. Porém, o tratamento agudo foi capaz de reduzir a expressão da Arc no HD, indicando uma redução no processamento exacerbado de consolidação dessa memória de medo nesses animais. Diferentemente do tratamento agudo, um tratamento mais prolongado com CBD prejudicou a persistência da memória do medo condicionado exacerbada e esse efeito pode estar relacionado ao processo de memória de longo prazo. Além disso, não podemos descartar o envolvimento dos aspectos emocionais nesses processos, uma vez que esses animais tratados por mais 1 semana com CBD demonstraram um claro efeito ansiolítico. Nos testes de memória não associada ao medo (memórias de reconhecimento e localização de objetos e espacial), os animais com DM1 induzido apresentaram prejuízo no índice de discriminação e nem o tratamento agudo e o contínuo com CBD alteraram significativamente esses índices. Em conjunto, apesar da necessidade de mais estudos, nestas condições experimentais específicas, nossos dados indicam que o CBD atua de forma distinta nesses animais com DM1 induzido dependendo do tipo de memória envolvida e dos tipos de tratamentos, como a duração do tratamento e a dose empregada. Enquanto o tratamento com CBD foi capaz de induzir efeitos benéficos sobre o processamento da memória de medo ou sobre a ansiedade dos animais, os mesmos tratamentos não alteraram as memórias espacial e de reconhecimento/localização de objetos que estão prejudicadas.

Abstract: Evidence indicates a higher prevalence of impaired fear memory processing in patients with type-1 diabetes mellitus (T1DM). Based on the lack of effective treatment of these conditions, it has been reported that cannabidiol (CBD), a non-psychotomimetic component of Cannabis sativa plant, presents a great potential to treat emotional aspects, in addition to improving several other pathological aspects associated with diabetes mellitus (DM). We investigated in induced T1DM animals whether a single injection or a more prolonged treatment (1 week) with CBD (0,10, 30, or 60 mg/kg; i.p.) would interfere in the consolidation process of contextual fear memory, as well as in its generalization and persistence. In addition, the effects of a single CBD injection on fear memory consolidation were also analyzed through the expression of activity-regulated cytoskeletal-associated protein (Arc) in the dorsal hippocampus (DH), an important area of the brain related to memory and emotional processes. We also studied whether this single injection of CBD would interfere with short-term memory. In order to assess whether the effects were exclusively associated with fear memory processing, after prolonged CBD treatment we also investigated anxiety-related behavioral responses. Finally, we studied the effects of single or continuous treatments with CBD on other types of non-fear-associated memories, such as object recognition and location memory, as well as spatial memory. A single injection of CBD was able to impair only the generalization of the fear memory, not being this effect persistent. This single injection was not able to alter the short-term contextual fear memory in these induced-T1DM animals. However, it was able to reduce the expression of Arc in the DH, indicating a reduction in the exacerbated processing of consolidation of this fear memory in these animals. Unlike acute treatment, longer treatment with CBD impaired the persistence of exacerbated conditioned fear memory and this effect may be related to the long-term memory process. Furthermore, we cannot rule out the involvement of emotional aspects in these processes, since these animals treated for another 1 week with CBD demonstrated a clear anxiolytic-like effect. In the tests of memory not associated to fear (recognition and location of objects and spatial memories), the animals with induced T1DM showed impairment in the discrimination index and neither the acute nor the continuous treatment with CBD significantly altered these indices. On these specific experimental conditions, our data indicate that CBD acts differently in these induced T1DM animals depending on the type of memory involved and the types of treatments, such as the duration of treatment and the dose used. While the CBD treatment was able to induce beneficial effects on the fear memory processing or on the anxiety response of the animals, the same treatments did not alter the spatial and object recognition/location memories that are impaired in these animals, showing a likely deficit in the separation pattern of these induced-T1DM animals.